Brines descreve, em cenas marcantes, o método de conhecimento da poética
(ou melhor, de ‘sua’ poética), uma espécie de libação capaz de levar às últimas
consequências a experiência de expor ao mundo o que de mais fundo há no ser
humano, em incursão que, primando pelo descortino, muito se aproxima do limiar
da morte.
O poema, claro, faz ressurgir imagens que se assemelham às do poema de
Byron – “Lines Inscribed Upon a Cup
Formed from a Skull” (“Uma taça feita de um crânio
humano”) –, embora com muito mais drasticidade, dadas as emoções
que afloram à mente do espanhol, agora já reconfiguradas pelo pungente
exercício intelectivo.
J.A.R. – H.C.
Francisco Brines
(n. 1932)
Métodos de conocimiento
En el cansancio de la
noche,
penetrando la más
oscura música,
he recobrado tras mis
ojos ciegos
el frágil testimonio
de una escena remota.
Olía el mar, y el
alba era ladrona
de los cielos;
tornaba fantasmales
las luces de la casa.
Los comensales eran
jóvenes, y ahítos
y sin sed, en el
naufragio del banquete,
buscaban la ebriedad
y el pintado cortejo
de alegría. El vino
desbordaba las copas,
sonrosaba
la acalorada piel,
enrojecía el suelo.
En generoso amor sus
pechos desataron
a la furiosa luz, la
carne, la palabra,
y no les importaba
después no recordar.
Algún puñal fallido
buscaba un corazón.
Yo alcé también mi
copa, la más leve,
hasta los bordes
llena de cenizas:
huesos conjuntos de
halcón y ballestero,
y allí bebí, sin sed,
dos experiencias muertas.
Mi corazón se serenó,
y un inocente niño
me cubrió la cabeza
con gorro de demente.
Fijé mis ojos lúcidos
en quien supo escoger
con tino más certero:
aquel que en un
rincón, dando a todo la espalda,
llevó a sus frescos
labios
una taza de barro con
veneno.
Y brindando a la nada
se apresuró en las
sombras.
O Retorno de Orestes
(Anton von Maron:
pintor austríaco)
Métodos de conhecimento
No cansaço da noite,
penetrando a mais
sombria música,
recuperei por trás de
meus olhos cegos
o frágil testemunho
de uma cena remota.
O mar recendia, e a aurora
era a ladra
dos céus; tornava
fantasmais
as luzes da casa.
Jovens eram os
comensais, e saciados
e sem sede; no
naufrágio do banquete,
buscavam a ebriedade
e o cortejo variegado
da alegria. O vinho
transbordava as
taças, corava
a acalorada pele, avermelhava
o solo.
Em generoso amor, eles
desataram os peitos,
a carne, a palavra à
furiosa luz,
e não lhes importava
não recordar depois.
Algum punhal sem êxito
um coração buscava.
Levantei também minha
taça, a mais leve,
cheia de cinzas até
as bordas:
ossos conjuntos de
falcão e de arqueiro,
e ali bebi, sem sede,
duas experiências mortas.
Meu coração serenou,
e um inocente menino
cobriu-me a cabeça
com gorro de demente.
Fixei meus olhos
lúcidos
em quem soube
escolher com tino mais certeiro:
aquele que, num
canto, dando as costas para tudo,
levou a seus frescos
lábios
uma chávena de barro
com veneno.
E sem nada brindar
se precipitou nas
sombras.
Referência:
BRINES, Francisco. Métodos de
conocimiento. In: __________. Antología
poética. Selección y prólogo de José Olivio Jiménez. Madrid, ES: Alianza
Editorial, 1986. p. 116-117. (“Sección: Literatura”; “El Libro de Bolsillo”; LB
1190)
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