Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Jorge Luiz Borges - Ao Espelho

Distintamente do enfoque que Rilke adota para falar dos espelhos nesta postagem, Borges os aborda num contexto à beira do paradoxal, haja vista que deles fala apenas de memória, tendo em conta a cegueira de que foi acometido, a impedir-lhe que lobrigasse, em idade avançada, os efeitos da duplicação, aliás, tema tantas vezes evocado em suas obras.

Espelhos são coisas estranhas, segundo Borges, motivo por que, em culturas distintas, assumem simbolismos os mais díspares: entre os escoceses, por exemplo, há a superstição de que, quando um homem vê a si próprio, aproxima-se da morte, ou melhor, seu verdadeiro “eu” vem buscá-lo de volta. Se assim for, quem estará aqui redigindo estas palavras, que não sendo o “eu” verdadeiro, também não é a contraparte que ainda não veio me buscar, uma vez que tenho o costume de dar umas miradas todas as manhãs no grande espelho à saída?! (rs).

J.A.R. – H.C.

Jorge Luis Borges
(1899-1986)

Al Espejo

¿Por qué persistes, incesante espejo?
¿Por qué duplicas, misterioso hermano,
el movimiento de mi mano?
¿Por qué en la sombra el súbito reflejo?

Eres el otro yo de que habla el griego
y acechas desde siempre. En la tersura
del agua incierta o del cristal que dura
me buscas y es inútil estar ciego.

El hecho de no verte y de saberte
te agrega horror, cosa de magia que osas
multiplicar la cifra de las cosas

que somos y que abarcan nuestra suerte.
Cuando esté muerto, copiarás a otro
y luego a otro, a otro, a otro, a otro…

En: “El Oro de los Tigres” (1972)

Vênus em frente ao espelho
(Peter Paul Rubens: pintor flamengo)

Ao Espelho

Por que persistes, incessante espelho?
Por que duplicas, misterioso irmão,
o movimento de minha mão?
Por que na sombra o súbito reflexo?

És o outro eu de que fala o grego
e espreitas desde sempre. E na lisura
da água incerta ou do cristal que dura
me buscas e é inútil eu estar cego.

O fato de não ver-te e de saber-te
te agrega horror, coisa de magia que ousas
multiplicar a cifra das coisas

que somos e que abarcam nossa sorte.
Quando estiver morrer, copiarás outro,
depois outro, e outro, e outro, e outro…

Em: “O Ouro dos Tigres” (1972)

Referência:

BORGES, Jorge Luis. Al espejo. In: __________. In: __________. Obras completas: 1923-1949. El oro de los tigres. Tomo I. 12. impresión. Buenos Aires, AR: Emecé, octubre de 2001. p. 1134.

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