O soneto é forma poética apropriada para recolher, em seus versos, um
paralelo entre as comuns representações de cenários do ‘habitat’ de animais em
museus de história natural – como os que havia no Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, no
Rio de Janeiro – e a própria decantação das palavras, em verbos e sintaxe, no
pleno correr da noite, no gabinete do poeta.
No fundo, trata-se de uma “natureza-morta” que o vate pinta com a pena,
jorrando, em sua escrita, o que de comum há numa paisagem mimetizada à natura:
aves, mamíferos e invertebrados empalhados, em meio à savana, “mais mortos que
os mortos”, embora parecendo vivos, para dar ao visitante-leitor a impressão de
que percorre o fronte onde a metáfora de fato acontece.
J.A.R. – H.C.
Horácio Costa
(n. 1954)
História Natural
Detrás do
taxidermista, há a palha,
detrás do
rinoceronte, a savana,
detrás desta
escritura só a noite,
a noite que galopa
até o fronte.
Na asa da mariposa
assoma a lua,
na cabeça do alfinete
brilha o sol,
nestas linhas
reverbera um sol negro,
o astro que ora sobe
no horizonte.
O animal dissecado da
sintaxe
provê o verbo, o
bastidor e a legenda
duma coleção mais
morta que os mortos.
No gabinete de
história natural
o visitante-leitor
detém-se face
a mamíferos e insetos
reluzentes.
Em: “Quadragésimo” (1999)
Filhotes de Urso
(Andre Dluhos: pintor
eslovaco)
Referência:
COSTA, Horácio. História natural. In:
ASCHER, Nelson et al. Poetas na
biblioteca: antologia. São Paulo, SP: Fundação Memorial da América Latina,
2001. p. 58.
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