Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

René Char - Comum Presença II

Um poema de urgência, imerso nos mistérios do labor poético, articulado em suaves transições discursivas – do pensamento livre frente às arbitrariedades do poder ao cumprimento impassível de nossa missão sobre a terra –, que, ao fim e ao cabo, levanta dúvidas sobre a sustentabilidade de tudo o que as mãos humanas são capazes de criar.

Eis as inquietações, o compromisso com os pares e o anseio por experiências mais significativas que o poeta firma como o seu plano de vida: o que disso sobeja são manifestações laterais que talvez não pesem o bastante no balanço da existência.

J.A.R. – H.C.

René Char
(1907-1988)

Commune présence

II

Tu es pressé d’écrire
Comme si tu étais en retard sur la vie
S’il en est ainsi fais cortège à tes sources
Hâte-toi
Hâte-toi de transmettre
Ta part de merveilleux de rébellion de
bienfaisance
Effectivement tu es en retard sur la vie
La vie inexprimable
La seule en fin de compte à laquelle tu
acceptes de t’unir
Celle qui t’es refusée chaque jour par les
êtres et par les choses
Dont tu obtiens péniblement de-ci de-là
quelques fragments décharnés
Au bout de combats sans merci
Hors d’elle tout n’est qu’agonie soumise
fin grossière
Si tu rencontres la mort durant ton labeur
Reçois-là comme la nuque en sueur trouve
bon le mouchoir aride
En t’inclinant
Si tu veux rire
Offre ta soumission
Jamais tes armes
Tu as été créé pour des moments peu
communs
Modifie-toi disparais sans regret
Au gré de la rigueur suave
Quartier suivant quartier la liquidation
du monde se poursuit
Sans interruption
Sans égarement

Essaime la poussière
Nul ne décèlera votre union.

Um presente do tempo
(Jim Daly: pintor norte-americano)

Comum Presença

II

És pressionado a escrever
Como se estivesses atrasado na vida
Se isso é assim acompanha tuas fontes
Apressa-te
Apressa-te em transmitir
Tua parcela de maravilhoso de rebelião
de beneficência
Efetivamente estás atrasado na vida
A vida inexprimível
A única afinal de contas à qual aceitas
unir-te
Aquela que te é recusada a cada dia
pelos seres e pelas coisas
Da qual obténs penosamente daqui e
dali alguns fragmentos descarnados
Ao fim de lutas sem piedade
Fora dela tudo é agonia submissa fim
grosseiro
Se encontras a morte enquanto trabalhas
Recebe-a como a nuca suada acha bom
o lenço seco
Ao te inclinares
Se quiseres sorrir
Oferece a submissão
Jamais tuas armas
Foste criado para momentos pouco comuns
Modifica-te desaparece sem remorso
À mercê do rigor suave
Parte após parte a liquidação do mundo
continua
Sem interrupção
Sem desvio

Enxameia a poeira
Ninguém denunciará vossa união.

Referência:
CHAR, René. Commune présence II / Comum presença II. Tradução de José Jeronymo Rivera. In: RIVERA, José Jeronymo (Organização e Tradução). Poesia francesa: pequena antologia bilíngue. 2. ed. revista e aumentada. Brasília, DF: Thesaurus, 2005. Em francês: 172 e 174; em português: 173 e 175.

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