Nascido em Belém do Pará, em 1917, o poeta Mário Cruz, hoje por demais
esquecido no cenário das letras pátrias – nem mesmo na internet encontramos o
ano de seu falecimento –, venceu ao concorrer com o livro “Cânticos Bárbaros”,
em 1937, o prêmio de poesia adjudicado pela Academia Brasileira de Letras.
O exemplar abaixo de sua poesia, como se pode perceber, tem apreciável
grau de correlação com alguns poemas de Augusto dos Anjos (1884-1914), naquilo que
pormenoriza os condicionamentos e atavismos que assolam o espírito humano,
embora ainda algo distante da linguagem intricada e cientificista do poeta
paraibano.
J.A.R. – H.C.
Mário Cruz
(1917-?)
(1917-?)
Antagonismo
– Que atavismos
herdei nos meus nervos doentios!
Por que esta sede
atroz de volúpias estranhas?
E este anseio de luz,
que me iguala às montanhas,
e este anseio de mar,
que me assemelha aos rios!
E esta paixão febril
de castos desvarios,
povoados de visões de
místicas façanhas!
E este dom de sentir
as angústias tamanhas
dos Lázaros do Amor,
errantes e sombrios!
Domina-me o furor dos
egipãs sagrados, (*)
e vejo desfilar,
desnudos, os Pecados,
ébrios de vinho e
sol, sob o fulgor das gemas.
E porque há um
demônio e um deus lutando em mim,
sinto a sede carnal
de carícias sem fim,
e a sede espiritual
de renúncias supremas!
O Anjo da Guarda a Proteger uma Criança
(Domenico Fetti:
pintor italiano)
Nota:
(*) Egipãs – Pãs que assumem a forma de
um bode com cauda de peixe; conta-se que o primeiro egipã era filho de Pã e da
ninfa Ega; ele teria ajudado Zeus em sua batalha contra Tifão, recuperando-lhe
os tendões que haviam sido retirados pelo monstro; como recompensa, Zeus o colocou nos céus como a constelação de Capricórnio.
Referência:
CRUZ, Mário. Antagonismo. In: JORGE, J.
G. de Araújo (Comp.). Antologia da nova
poesia brasileira. Rio de Janeiro: Casa Editora Vecchi Ltda., 1948. p. 279.
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