Como este poema calou fundo n’alma! Afigurou-se-me uma mensagem pessoalmente
dirigida, com as alusões às mangueiras e ao trinado abundante dos pássaros a
revoar entre as árvores, num transcurso de tempo que já remonta a várias
décadas.
Tal qual se afirma, a melodia tranquila, de então, foi comutada pelo
ruído lamentoso das “aves de metal” – seriam os aviões?!... Nada mais remanesce
estável nos contrafortes da memória, capaz de entrar em ressonância com a
concretude presenciada pelos nossos olhos contemporâneos: em cada canto, um
anjo do ocaso se manifesta!
J.A.R. – H.C.
Paulo Bomfim
(n. 1926)
Poema da Procura
Em nenhuma esquina do
teu bairro
Encontrarás o Domingo
de tua infância
Povoado de pássaros e
melodias.
Hoje, o céu é o
lamento das aves de metal,
E os realejos se
converteram
Em sereias portadoras
de cantos funestos.
Inutilmente
recordarás
A sombra antiga das
mangueiras
E os crepúsculos
tranquilos do mundo que perdeste.
Hoje, és o ser
penetrado de ruídos
E em redor de tua
angústia
Desfilam máquinas
estranhas
E a multidão de
rostos que não reconheces...
Além do teu corpo
sepultado entre blocos de pedra,
Há um anjo da morte
em cada esquina do universo...
Uma Tarde de Domingo
na Ilha de Grande Jatte
Referência:
BOMFIM, Paulo. Poema da procura. In:
CAMPOS, Milton de Godoy (Ed.). Antologia
poética da geração de 45. 1ª série. São Paulo, SP: Clube de Poesia, 1966.
p. 86.
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