Columbus - Geórgia (EUA)
“Nossa missão é
atravessar com força e dignidade os dias da nossa humilhação. Nosso orgulho tem
que ser firme, pois sabemos o valor da mente e da alma humana. Temos que
ensinar nossas crianças. Temos que nos sacrificar para que elas possam
conquistar a dignidade do estudo e do conhecimento. Porque vai chegar o dia.
Vai chegar o dia em que as riquezas que existem em nós não serão mais encaradas
com escárnio e com desprezo. Vai chegar o dia em que vamos poder servir de
fato. Em que vamos trabalhar e o nosso trabalho não será desperdiçado. E a
nossa missão é esperar por esse dia com força e fé”. (McCULLERS, 2007, p. 246)
A citação acima, extraída da Parte 2 do
Capítulo 6 do livro em referência, traduz o discurso que o Dr. Copeland, um
personagem negro, faz em sua festa de Natal. Pleno de sabedoria, ele tenta transmitir,
às pessoas de seu povo, conselhos e coragem para avançar na luta cotidiana.
Carson McCullers
(1917-1967)
Apreciação de Karl
Heinz Petzler para
“O coração é um
caçador solitário”
(“The heart is
a lonely hunter”)
(PETZLER, 2007, p. 411)
(PETZLER, 2007, p. 411)
O seu primeiro romance tornou Carson
McCullers numa sensação literária, com apenas 23 anos. Dotado de um profundo
sentido de isolamento moral e com um compadecido olhar pela vida interior dos
seus personagens, Coração Solitário
Caçador é considerado não só a sua obra-prima como um marco da literatura
do século XX.
Situado numa deprimente vila na Geórgia
dos anos 30, o cenário pode parecer provinciano, mas o seu cosmos é universal e
eterno. No centro da narrativa está o surdo-mudo John Singer, que se torna
confidente de alguns marginalizados, cada um dos quais – preocupado com o seu
lugar no mundo – anseia escapar das circunstâncias à sua maneira: Mick Kelly,
uma adolescente cuja ambição íntima é compor sinfonias, é filha de
proprietários da pensão, onde Singer vive depois do seu melhor amigo ter ficado
demente; Jack Blount, um alcoólico por vezes violento, obstinado com as suas
ideias socialistas frustradas; Dr. Copeland, um médico negro que luta, em vão,
pela causa da igualdade racial e Biff Brannon, o proprietário de uma cafeteria
com desejos sexuais ambíguos. Cada um deles acha que o surdo-mudo Singer os
compreende e estima. Ironicamente este, também algo obcecado por uma amizade de
reciprocidade questionável, suicida-se após a morte do seu amigo enlouquecido.
Conjugando o isolamento
espiritual inerente à condição humana com uma hábil compreensão das tensões
raciais no Sul dos EUA, McCullers tece uma história inesquecível, dando voz aos
rejeitados, esquecidos e maltratados – e, através de Mick, à serena e
intensamente pessoal busca por beleza. Coração
Solitário Caçador ainda hoje continua a ser uma obra literária
incontornável, tão oportuna e poderosa como na altura de sua publicação.
Avaliação da obra pelo bloguinho (0-10): 8,5.
Obs.: Há uma adaptação cinematográfica,
de 1968, intitulada no Brasil como “Por que tem que ser assim?”, dirigida por Robert Ellis Miller, apenas razoável quando em cotejo com
a obra que lhe deu origem.
J.A.R. – H.C.
PETZLER, Karl Heinz. Coração solitário caçador.
In: BOXALL, Peter (ed.). 1001 livros
para ler antes de morrer. Tradução de Manuela Brazão et al. Editor da
edição portuguesa Karl Heinz Petzler. Lisboa, PT: Lisma, 2007. p. 411.
McCULLERS, Carson. O coração é um caçador solitário. Tradução de Sonia Moreira. São
Paulo, SP: Companhia das Letras, 2007.
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