Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Cláudio Murilo Leal - Poética

Como já tantas postadas neste bloguinho, temos aqui mais uma poesia a tratar da própria poesia, ou melhor, metapoesia a dedicar-se à sua forma de expressão e à permanência no espaço literário quotidiano.

Nota-se cerca influência do poeta João Cabral de Melo Neto no poema do carioca Murilo: voluntária ou casual, o fato é que a ideia de que a poesia se assemelha a uma flor nascente em instâncias decompostas também aparece no poema “Antiode” do pernambucano, sugerindo a ocorrência de um certo grau de referência cruzada entre tais composições.

J.A.R. – H.C.

Cláudio Murilo Leal
(n. 1937)

Poética

Poesia, como sobrevives
Ao ódio das bombas?
E pulsas ainda, fria,
No refúgio das sombras?

Poesia, quem te reconhece
Perene fruto? Ácido
O sumo, impenetrável
A polpa de ferro ou aço.

Uma flor fétida
Nasce nos mangues
– Homem – perdido
Entre o pus e o sangue.

A poesia não sutura
Seu coração aberto.
Nem indica (entre cruzes)
O rumo certo.

Poesia, negra falua,
Arrasta sobre nós
Teus podres remos.
E deixa-nos sós. 

Carpa e Flor de Lótus
(Guilherme Maximini: pintor brasileiro)

Referência:

MURILO, Cláudio. Poética. In: FÉLIX, Moacyr (Dir.). Poesia Viva I. Introdução de Antônio Houaiss. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira, 1968. p. 167-168. (Coleção ‘Poesia Hoje’, Direção Moacyr Félix, v. 18, Série ‘Novos Poetas do Brasil’)

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