Este poema, da carioca Verônica de Aragão, pelo seu mais explícito
sentido, fez-me lembrar da pintura “A Origem do Mundo”,
de Gustave Coubert, constante do acervo do Museu de Orsay, em Paris.
Veja lá, leitor, que a autora vislumbra a imortalidade humana presente
na própria constância de sua quotidiana morte. Tudo porque o útero feminino – “uma
janela aberta para o infinito” – é capaz de dar origem a uma nova vida, a se
estender finitamente no tempo, eternizando um gênero que, em sua
individualidade, fadado está ao aniquilamento.
J.A.R. – H.C.
Útero Divino
(Autoria
Desconhecida)
Fenda do Tempo
Cada útero
é uma fenda no tempo
em que os homens
querem estar
pela ilusão de conquistá-lo,
pela ilusão de conquistá-lo,
pelo prazer de
dominá-lo
e o desejo de
eternidade.
Cada útero
é uma janela aberta
para o infinito em
chamas,
para o inefável:
nela o delírio dos
homens encontra
catarse de todas as
dores;
nela o princípio e o
fim.
Penetrá-la é renascer
pela ilusão finita da
reversibilidade.
E vai o homem,
como os relógios, com
o seu pêndulo,
a avançar no tempo,
vagando de par em
par.
E eis o fim de tudo,
no mesmo ermo
em que tudo começa.
Referência:
ARAGÃO, Verônica. Fenda do tempo. In: GARCÍA, Xosé Lois. Antologia da poesia brasileira / Antología de la poesía brasileña. Edición bilingüe.
Santiago de Compostela, Galiza, U.E.: Laiovento, 2001. p. 500.
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