Nesta postagem, temos um poema em que o seu autor – o poeta, editor e
pintor Lawrence Ferlinghetti – relembra a influente crítica do artista espanhol
Francisco de Goya à guerra e, em conexão com a sua terra natal, os EUA, o poder
de multiplicação de mitos e de destruição da sociedade norte-americana.
São dilemas de duas sociedades distintas: a primeira, a espanhola, da
qual as obras de Goya ilustram a ausência de sentimentos de compaixão. Outra, a
norte-americana, em que o calor humano e a proximidade pelo contato são
manifestações cada vez mais raras.
J.A.R. – H.C.
Lawrence Ferlinghetti
(n. 1919)
In Goya’s
greatest scenes we seem to see
In Goya’s greatest scenes we seem to see
the people of the world
exactly at the moment when
they first attained the title of
‘suffering humanity’
They writhe upon the page
in a veritable rage
of adversity
Heaped up
groaning with babies and bayonets
under cement skies
in an abstract landscape of blasted trees
bent statues bats wings and beaks
slippery gibbets
cadavers and carnivorous cocks
and all the final hollering monsters
of the
‘imagination of disaster’
they are so bloody real
it is as if they really still existed
And they do
Only the landscape is changed
They still are ranged along the roads
plagued by legionnaires
false windmills and demented roosters
They are the same people
only further from home
on freeways fifty lanes wide
on a concrete continent
spaced with bland billboards
illustrating imbecile illusions of happiness
The scene shows fewer tumbrils
but more strung-out citizens
in painted cars
and they have strange license plates
and engines
that devour America
Saturno devorando um filho
(Francisco de Goya:
pintor espanhol)
Nas melhores cenas de Goya parece que
vemos
Nas melhores cenas de
Goya parece que vemos
as pessoas do mundo
no exato momento em
que
pela primeira vez
elas ganharam o título
de ‘humanidade
sofredora’
Tais pessoas se
contorcem na página
num verdadeiro acesso
de adversidade
Amontoadas
gemendo com bebês e
baionetas
sob um céu de cimento
pela paisagem
abstrata de árvores bombardeadas
estátuas decaídas
asas bicos de morcegos
patíbulos
escorregadios
cadáveres galos
carnívoros
monstros finais
berrantes todos
da
‘imaginação do
desastre’
tão danados de reais
que até parece que
ainda existem
E existem mesmo
Só mudou a paisagem
Todos continuam em
fila nas estradas que estão
infestadas de
legionários
falsos moinhos de
vento e grandes galos dementes
E são aquelas mesmas
pessoas
apenas mais distantes
de casa
e em estradonas de
cinquenta pistas
num continente de
concreto
demarcado por pencas
de cartazes
que ilustram ilusões
imbecis de felicidade
A cena mostra menos
carretas para a forca
mas muito mais
cidadãos mutilados
em carros pintados
que têm placas
estranhonas
e motores
que devoram a América
Referências:
FERLINGHETTI, Lawrence. In Goya’s greatest scenes we seem to see. In:
HOOVER, Paul (Ed.). A postmodern
american poetry: a norton anthology. New York, NY: W. W. Norton &
Company Inc., 1994. p. 43-44.
FERLINGHETTI, Lawrence. In Goya’s greatest scenes we seem to see / Nas melhores cenas de Goya parece que vemos. Tradução de Leonardo Fróes. In: __________. um parque de diversões da cabeça. Tradução de Eduardo Bueno e Leonardo Fróes. 2. ed. bilíngue. Porto Alegre, RS: L&PM, 2007. Em inglês: p. 14 e 16; em português: 15 e 17. (Coleção ‘L&PM Pocket’; v. 661)
FERLINGHETTI, Lawrence. In Goya’s greatest scenes we seem to see / Nas melhores cenas de Goya parece que vemos. Tradução de Leonardo Fróes. In: __________. um parque de diversões da cabeça. Tradução de Eduardo Bueno e Leonardo Fróes. 2. ed. bilíngue. Porto Alegre, RS: L&PM, 2007. Em inglês: p. 14 e 16; em português: 15 e 17. (Coleção ‘L&PM Pocket’; v. 661)
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