A poética do paulista Claudio Daniel é, “em larga medida, calcada em
miragens despertadas por texturas, pela evocação de delicadas sensações
corpóreas e por uma imagética que combina elementos orientais e referências à
poesia neobarroca latino-americana (que inclui contemporâneos como Haroldo de
Campos e o cubano José Kozer) (PINTO, 2006, p. 174-175).
“‘Montaigne’, o admirável retrato do escritor francês do século 16,
começa com a imagem voluptuosa da ‘cor mediterrânea’ e prossegue com um esboço
quase prosaico de sua biografia (em que não faltam remissões a suas leituras e
a sua amizade com La Boétie, ‘o amigo morto’) para terminar com a sentença,
fiel ao autor dos Ensaios, de que ‘filosofar é aprendizado da morte’” (PINTO,
2006, p. 175).
J.A.R. – H.C.
Claudio Daniel
(n. 1962)
Montaigne
Acende a cor
mediterrânea,
música para o latim.
Depois, rabisca um
seio
de Medusa, inchado
na ponta da teta.
Lições de esgrima,
para o jovem
nobre; e o calor da
sela,
em dorso de cavalo
escuro.
Seigneur, de afilado
traço (hebreu) da
Ibéria,
bateu lâmina em
lâmina
vencida, amou o jogo,
as damas e o amigo
morto.
Foi diplomata, leitor
de Sêneca e Plutarco;
soube que o Esclesiastes
era um códice grego,
algo mais que
escritura.
Estoico, serenou
paixões,
recusou trovão e
tumulto:
viu que a história
da miséria humana
é uma parcela do
possível.
E soube em sua pele,
em seu sangue,
filosofar
é aprendizado da
morte.
De: “A Sombra do Leopardo”
Michel de Montaigne
[1533-1592]
(Retrato de autoria desconhecida)
Referência:
DANIEL, Claudio. Montaigne. In: PINTO, Manuel da Costa (Edição, Seleção e Comentários). Antologia comentada da poesia brasileira do século 21. São Paulo: Publifolha, 2006. p. 173-174.
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