Aqui está um dos mais significativos escritores catalães do período
pós-2GM, Salvador Espriu, a declarar o seu amor pela terra natal, em meio às
denúncias contra as agruras do período franquista.
Diz ele que apreciaria bastante partir para o norte, para outras plagas,
onde as pessoas seriam mais limpas, nobres, cultas, ricas, livres acordadas e
felizes, distintamente das que habitam a sua covarde, velha, selvagem e infeliz terra.
Mas
um aparte: por um momento, imaginei que Espriu tivesse experimentado a síndrome
que, como se diz, aprecia o gramado do vizinho como muito mais bonito.
Afinal,
a região da Catalunha é também muito bonita, Barcelona bem ali, como ponto de
atração para um mar de gente, dos turistas aos residentes no entorno, Espriu aí
incluso, pois faleceu exatamente nessa bela cidade.
Por
isso, imagino que tenha sido mesmo a ditadura de Franco que tenha toldado a
mente do poeta, tornando-o amargo e quase sem esperança. Mas como sempre, o
tempo é o curandeiro que a tudo remedia. As coisas mudaram bastante por lá.
J.A.R. – H.C.
Salvador Espriu
(1913-1985)
Assaig de
Càntic en el Temple
Oh, que cansat estic
de la meva
covarda, vella, tan
salvatge terra,
i com m’agradaria
allunyar-me’n,
nord enllà,
on diuen que la gent és neta
i noble, culta, rica,
lliure,
desvetllada i feliç!
Aleshores, a la
congregació, els germans dirien
desaprovant: “Com
l’ocell que deixa el niu,
així l’home que se’n
va del seu indret”,
mentre jo, ja ben
lluny, em riuria
de la llei i de
l’antiga saviesa
d’aquest meu àrid
poble.
Però no he de seguir
mai el meu somni
I em quedaré aquí
fins a la mort.
Car sóc també molt
covard i salvatge
i estimo a més amb un
desesperat dolor
aquesta meva pobra,
bruta, trista,
dissortada pàtria.
Café em Barcelona
(Oleg Trofimoff: pintor russo)
(Oleg Trofimoff: pintor russo)
Ensaio de Cântico no Templo
Oh, como estou
cansado desta minha
covarde, velha,
tão selvagem terra,
e como gostaria
de ir embora,
para o norte,
onde dizem que o
pessoal é limpo
e nobre, culto,
rico, livre,
acordado e
feliz!
Decerto, na congregação,
diriam os irmãos
desaprovando: “Como
pássaro o ninho,
assim abandona
um homem o seu lugar”,
enquanto eu,
bem longe, me riria
da lei e do
antigo saber
de meu árido
povo.
Mas nunca vou
realizar meu sonho
e ficarei aqui
até a morte.
Pois sou covarde
e selvagem – eu também! –
e amo, além do
mais, com uma
desesperada dor,
esta minha
pobre,
suja, triste, infeliz
pátria.
Referência:
ESPRIU, Salvador. Ensaio de cântico no
templo. In: SOLER, Luis (Organização e Tradução). 4 poetas da Catalunha. Edição bilíngue. Florianópolis: Editora da
UFSC, 2010. Em catalão, p. 92; em português, p. 93.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário