Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Micheliny Verunschk - G

Pelas palavras do jornalista e crítico Manuel da Costa Pinto (2006, p. 368), na poesia de rastros justapostos de Micheliny, um “gato de ébano” vai se depurando em “gato geométrico”, daí a “gato concreto”, até ser reduzido à letra única do título.

 

Como num processo de ilações e corolários que, se fosse no âmbito das ciências, caracterizar-se-ia como dedutivo, puro silogismo, das premissas maiores às assertivas menores: um gato de ébano, um bicho de carne. Elementares palavras, num processo contínuo de derivação.

 

J.A.R. – H.C.

 

Micheliny Verunschk

(Recife, PE: 1972)

 

G


Era um gato de ébano

estático e mudo:

um gato geométrico

talhando em silêncio

o seu salto mais duro.

Era um gato macio

se visto de perto,

um bicho de carne

ao olho certeiro,

arrepio de sombra

subindo nas pernas,

um lance no escuro,

um tiro no espelho.

O gato era um ato,

uma estátua viva,

uma lâmpada acesa

no umbigo de Alice.

Era um gato concreto

no meio da sala:

era uma palavra

afiando palavras.

Era a fome do gato

e sua pata à espreita,

veludo-armadilha:

uma única letra.

 

(De: “Geografia Íntima do Deserto”)

   


Referência:

 

VERUNSCHK, Micheliny. G. In: PINTO, Manuel da Costa (Edição, Seleção e Comentários). Antologia comentada da poesia brasileira do século 21. São Paulo: Publifolha, 2006. p. 366.

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