Pere Quart, pseudônimo do poeta catalão Joan Oliver, já esteve presente
nestas paragens (veja aqui). E como se
trata de um poeta dos melhores, retorna neste momento, para lançar bravatas
àqueles vates “verbosos”, que nada dizem a não ser um emaranhado de palavras
selecionadas ao léxico, mas que não atingem o cerne mesmo da poesia.
Para tantas palavras lançadas ao léu, Quart sugere a apreciação mais
ponderada do silêncio: que se faça valer a potência de cada lágrima derramada,
de cada sussurro escandido, eis que são o lídimo “cântico da vida”.
J.A.R. – H.C.
Joan Oliver
(1899-1986)
Hi ha coses massa pures
Hi ha coses massa pures
per a ser dites
o només pensades.
Però els poetes,
incontinents,
verbosos,
gosen inquietar les zones
inefables
amb triades paraules
al capdavall estúpides.
I pretenen encara
ser els torsimanys
de la musa inservible
O d’algun déu
com tots sobrer.
¿O espremen d’ells
mateixos
sucs celestes,
potser?
Sort que escassegen els
miralls,
puix que els poetes,
en efecte,
són ben ridículs
en llur jactància.
Valdria més callar,
que tots calléssim.
I aleshores parar les
grans orelles
i aprendre alguna
cosa
dels planys, les
boniors,
el càntic de la vida;
dels entranyats
batecs
i els admirables –
malgrat tot –
silencis animais
de l’home,
quasi impossible
provatura.
Pureza
(Jan Lawnikanis:
artista australiano)
Há coisas por demais puras
Há coisas por demais
puras
para serem faladas
ou pensadas, que
seja.
Mas os poetas,
intrometidos,
verbosos,
ousam inquietar as
zonas inefáveis
com seletas palavras
de fato estúpidas.
E pretendem ainda
ser alcoviteiros
de uma musa
imprestável
ou de algum deus
como todos sobejo.
Ou espremem deles
mesmos
sucos celestiais,
quem sabe?
Ainda bem que
escasseiam espelhos
porque os poetas, em
verdade,
são bem ridículos
na sua empáfia.
Melhor seria calar
– nós todos, calar –
E, então,
escancarando orelhas,
aprender muita coisa
dos prantos, os
sussurros,
o cântico da vida;
dos entranháveis
pulsos
e os fascinantes –
apesar de tudo –
silêncios animais
do homem,
experiência como que
impossível.
Referência:
Oliver, Joan. Hi ha coses massa pures /
Há coisas por demais puras. In: SOLER, Luís (Organização e tradução). 4 poetas da Catalunha. Florianópolis,
SC: Editora da UFSC, 2010. Em catalão: p. 74 e 76; em português: 75 e 77.
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