Pere Quart, pseudônimo de Jean Olivier, tornou-se um dos maiores poetas
catalães do século XX. É dele o breve poema prescritivo de hoje, na forma de um
codicilo, nome que se dá a disposições de última vontade, acerca de bens de
pouco relevância.
Mas não é de pouco valor aquilo a que o poeta faz referência: é sua
sugestão sobre o que entende como o melhor “modus vivendi”. Três “humildes”
afazeres, algo como o sexo, o pensamento e a boa vida, o alimento aí incluso. A
Literatura recheia o resto.
Assim como um conjunto finito de três elementos – e as Letras a
preencher todo o espaço ainda não contemplado do conjunto universo: uma inusual metáfora matemática, não?!
J.A.R. – H.C.
Joan Olivier nasceu
em Sabadell, cidade fabril próxima a Barcelona, no seio de uma família da alta
burguesia industrial. Formou-se em Direito, mas as suas atividades se
desenvolveram sempre no campo das Letras: poesia, prosa literária, periodismo e
teatro – para o qual, além de suas próprias e notáveis peças, traduziu obras de
Molière, Shaw, Tchecov, Beckett, Brecht etc. (SOLER, 2010, p. 49).
(1899-1986)
Codicil d’un Poeta
Us llego, amics,
senzillament,
els tres quefers
humils de sempre:
viure (i menjar) amb
decòrum cada dia,
si podeu, endegar
cobejança i luxúria;
pensar (creure o
dubtar)
en la certesa i les
hipòtesis
de la mort de la carn
i la vida nova de
l'ànima.
No hi ha res a fer; i
ja basta.
La resta és
literatura.
Sidney Nolan: pintor
australiano
Legado de um Poeta
Deixo a vocês,
amigos, simplesmente,
os três afazeres
humildes de sempre:
viver (e comer)
decentemente, todo dia;
dar um jeito, se
podem, na cobiça e no sexo;
pensar (crer ou
duvidar)
na certeza e palpites
da morte da carne
e a nova vida da
alma.
Não há mais nada o
que fazer: já basta.
Literatura, o resto.
Referência:
OLIVER, Joan. Legado de um poeta. In:
SOLER, Luis (Organização e Tradução). 4
poetas da Catalunha. Edição bilíngue. Florianópolis: Editora da UFSC, 2010.
Em catalão, p. 72; em português, p. 73.
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