Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 12 de maio de 2015

Eugenio Montale - O Vazio

Nobel de Literatura de 1975, o italiano Eugenio Montale descreve com percuciência o lado oprimente de tudo o quanto existe, mesmo o vazio, onde antes se poderia encontrar guarida.

Mas se o que resta é o ar, Montale parece crer que ele é tudo de que se reveste o universo, mesmo que o tenhamos preenchido do que quer que seja – fatos, movimentos de pertencimento etc.

Observe, leitor: há uma linha tênue no poema, entre aquilo a que atribuímos valor e o mais radical niilismo – um nada absoluto incapaz de ser preenchido, por mais que se recorra à mais paradoxal mixórdia de elementos caracteristicamente humanos.

Será que retornaremos sempre ao vazio depois de percorrermos todas as veredas possíveis do universo? Uma visita aos gregos, como o regresso de Ulisses a Ítaca: isto aqui, para quê? Para nada?

J.A.R. – H.C.

Eugenio Montale
(1896-1981)

Il Vuoto

È sparito anche il vuoto
dove un tempo si poteva rifugiarsi.
Ora sappiamo che anche l’aria
è una materia che grava su di noi.
Una materia immateriale, il peggio
che poteva toccarci.
Non è pieno abbastanza perché dobbiamo
popolarlo di fatti, di movimenti
per poter dire che gli apparteniamo
e mai gli sfuggiremo anche se morti.
Inzeppare di oggetti quello ch’è
il solo Oggetto per definizione
senza che a lui ne importi niente o turpe
commedia. E con che zelo la recitiamo!

Gato num Quarto Vazio
(Carol Wilson: artista norte-americana)

O Vazio

Tem desaparecido também o vazio
onde, há algum tempo, podia-se encontrar refúgio.
Agora sabemos que até mesmo o ar
é uma matéria que nos faz pressão.
Uma matéria imaterial, o pior
que poderia tocar-nos.
Não está plenamente abastado porque devemos
povoá-lo de fatos, de movimentos
para poder dizer que lhe pertencemos
e nunca lhe fugiremos ainda que morramos.
Preencher de objetos aquele que é
o único Objeto por definição
sem que a ele nada importe, oh torpe
comédia. E com que zelo a recitamos!


Referência:

MONTALE, Eugenio. Il vuoto. In: __________. It depends: a poet’s notebook. A notebook of four years. Bilingual edition. Translated from the Italian & with an introduction by G. Singh. Published by James Laughlin. New York, NY: New Direction Publishing Corporation, 1980. p. 32.

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