Uma graça de poema: é o modo pelo qual poderíamos nos expressar para
qualificar a presente poesia da grega Melissânti. Redigida num tom espirituoso,
fez-me lembrar certa passagem de uma letra do compositor Caetano Veloso (“Dom
de Iludir”): “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”.
O que fazer se baleia e hipopótamo julgam que o “melhor dos mundos possíveis” é
representado ontologicamente pelos seres de suas espécies? De nossa parte,
preferimos a experiência de sermos humanos. Mas há quem prefira ter identidade
com outros animais: ou de outro modo, como caberia a expressão “você é um homem
ou um rato?” (rs).
J.A.R. – H.C.
A ânsia de infinito,
o mistério da morte e a nostalgia de Deus são alguns dos temas mais frequentes
na poesia de Melissânthi. Daí tê-la Kimon Friar filiado àquela linhagem de
poetas que escrevem de preferência acerca “do mistério que é a vida e da
aniquilação ou salvação que nos virá ao encontro na ocasião da morte”. As mais
das vezes, escrevem tais poetas menos a partir das certezas da fé que das
incertezas do viver, possuídos que estão do sentimento do “absurdo da
existência como consciência em meio a um universo de objetos inconscientes”. É
esse sentimento existencial (ou existencialista) que predomina nos poemas mais
característicos de Melissânthi, nome literário de Hebe Koúyia Skandaláki,
nascida em Atenas em 1910(*), onde fez os seus estudos. Passou algum
tempo num sanatório da Suíça tratando-se de tuberculose, e de volta a Atenas
dedicou-se ao magistério e ao jornalismo. Além da poesia, cultivou a música e a
pintura. Traduziu para o grego poetas americanos (Robert Frost, Emily
Dickinson) e franceses (Verlaine, Pierre Garnier). O seu livro de estreia, Vozes de Inseto [Fones Entornou], é de
1930. A ele se seguiram, nos anos subsequentes, dez outros, entre os quais O Retorno do Pródigo [Gyrismós toú
Asótou, 1936], Forma Humana
[Anthrópino Sxíma, 1961], A Barreira do
Silêncio [To Fragma tis Siopís, 1965] e Novos
Poemas [Néa Poiímata, 1974]. Alguns desses livros – mais tarde reunidos
todos em Os Poemas de Melissânthi [Tà
Poiímata tis , 1975] – foram distinguidos com prêmios literários, inclusive O Irmãozinho [O Mikrós Adelfós, 1960], uma
peça de teatro para crianças (PAES, 1986, p. 252).
Melissânthi
[Hebe K. Skandaláki]
(1907-1990)
Ρώτησαν τη φάλαινα
αν θα ΄θελε να πεθάνει
και να μεταμορφωθεί
σ΄ ανάλαφρο πλάσμα του αέρα
κι απάντησε· «Όχι, ποτέ!»
Ναι, θα ΄θελε για πάντοτε να μείνει
μέσα στη βεβαιότητα του υγρού στοιχείου
μια φάλαινα και τίποτα άλλο.
«Φάλαινα στην αιωνιότητα! – φώναξε κάποιος –
Μ΄ αυτό είναι μια τερατωδία
Να ΄ταν τουλάχιστον, καθώς εγώ
ένας ιπποπόταμος!»
Baleia
(Steve Greco: artista
norte-americano)
Satyricon
Perguntaram à baleia
se queria morrer
para transformar-se
numa lépida
criatura do ar.
Ela respondeu: “Jamais!”
Queria mesmo era
ficar para sempre
na segurança do seu
líquido elemento,
uma baleia apenas,
nada mais.
“Uma baleia por toda
a eternidade! – exclamou alguém.
– Mas isso é
monstruoso.
Se ao menos fosse,
como eu,
um hipopótamo!”
De: Novos Poemas
Dom de Iludir
(Caetano Veloso)
Nota:
(*) Há controvérsia quanto ao
efetivo ano de nascimento da poetisa, pois alguns ‘sites’ especializados em
poesia grega apontam o ano de 1907.
Referência:
PAES, José Paulo (seleção e tradução). Poesia moderna da Grécia. Rio de
Janeiro: Guanabara, 1986. p. 251.
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