Auden tenta
perscrutar o infinito e incognoscível Ser – fundamento para todas as coisas –,
a partir do ser finito que somos e de tudo quanto nos rodeia – pedras, sapatos
velhos etc. –, os quais veiculam alguns “sinais sacramentais”, mistérios que
nos são acenados sobre a “Primeira Pessoa”, “única e invisível fonte das coisas
específicas”, poder-se-ia dizer, materializadas neste mundo visível.
A própria poesia tem
lá o seu lado mágico, os seus mistérios, tomando parte também na ambivalência
do sagrado, quando recolhe em suas linhas o que nos sucede em eventos e
pensamentos, transmutados, contudo, em moldes sugestivos e inspiradores.
As estações e os seus
significados para os seres humanos, em contraste com o que elas representam
para as aves, animais e plantas, configuram o fundo temático no qual se
desenvolvem as estâncias do poema, ele mesmo, também, um elogio ao poder que o
inverno tem para nos tornar mais reflexivos ao longo da quadra, voltados de
certa forma a promover uma síntese com sentido orientador para o porvir.
J.A.R. – H.C.
W. H. Auden
(1907-1973)
In Due Season
Springtime, Summer
and Fall: days to behold a world
Antecedent to our
knowing, where flowers think
Theirs concretely in
scent-colors and beasts, the same
Age all over, pursue
dumb horizontal lives
On one level of
conduct and so cannot be
Secretary to man’s
plot to become divine.
Lodged in all is a
set metronome: thus, in May
Bird-babes, still in
the egg, click to each other Hatch!;
June-struck cuckoos
go off pitch; when obese July
Turns earth’s heating
up, unknotting their poisoned ropes,
Vipers move into
play; warmed by October’s nip,
Younger leaves to the
old give the releasing draught.
Winter, though, has
the right tense for a look indoors
At ourselves, and
with First Names to sit face to face,
Time for reading of
thoughts, time for trying out
Of new meters and new
recipes, proper time
To reflect on events
noted in warmer months
Till, transmuted,
they take part in a human tale.
There, responding to
our cry for intelligence,
Nature’s mask is
relaxed into a mobile grin,
Stones, old shoes,
come alive, born sacramental signs,
Nod to us in the
First Person of mysteries
They know nothing
about, bearing a message from
The invisible sole
Source of specific things.
Primavera, Verão,
Outono e Inverno
(Shelley Bain:
artista norte-americana)
Na Época Oportuna
Primavera, verão e
outono: dias para contemplar um mundo
Precedente ao nosso
conhecimento, onde as flores ruminam
Os seus concretamente,
em termos de cores e olores, e os animais, todos
Da mesma época, agarram-se
às suas silentes vidas horizontais
De acordo com um
código de conduta e, portanto, não se habilitam
A secretariar o homem
em sua trama para se tornar divino.
Alojado em tudo há um
metrônomo estabelecido: então, em maio,
Bebês-pássaros, ainda
no ovo, estalidam uns nos outros para Rebentar!;
Os cucos, extasiados
por junho, perdem o tom; quando o obeso julho
Volta a aquecer a
terra, desatando suas cordas envenenadas,
As víboras entram no
jogo; excitadas pela friagem de outubro,
As folhas mais tenras
cedem às mais velhas a corrente de ar que as libera.
O inverno, no
entanto, tem o tempo certo para um olhar dentro
De nós mesmos, e com
Nomes Próprios para nos sentarmos frente a frente:
Tempo para a leitura
de pensamentos, tempo para experimentar
Novas métricas e
novas receitas, tempo adequado
Para refletir sobre
eventos observados nos meses mais cálidos,
Até que,
transmutados, eles façam parte de um relato humano.
Mais adiante,
respondendo ao nosso clamor por inteligência,
A máscara da natureza
se relaxa, convertendo-se num expressivo sorriso;
Pedras, velhos
sapatos, ganham vida, nascem sinais sacramentais,
Com a cabeça, acenam-nos
na Primeira Pessoa dos mistérios
Dos quais nada sabem,
trazendo uma mensagem da
Única e invisível
Fonte das coisas específicas.
Tradução: João A. Rodrigues
Referência:
AUDEN, W. H. In due
season. In: __________. Collected poems. Edited by Edward Mendelson. 1.
ed. New York, NY: Vintage Books (A Division of Random House), feb. 1991. p.
801. (‘Vintage International’)
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P.s.: Esta minha versão ao português do poema de W. H. Auden foi, indevidamente, imputada ao literato paulista José Paulo Paes pela mantenedora do blog abaixo, motivo pelo qual venho aqui ratificá-la, elidindo assim aquilo que considero uma prática reprovável, que não se limita a copiar – diga-se, por oportuno, texto e estampa –, indo mais além, incorrendo em falsas atribuições.
ResponderExcluirhttps://speglich.blogspot.com/2023/04/shelley-bain-primavera-verao-e-outono.html
João A. Rodrigues