Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

Nicolas Boileau - A Arte Poética (Excertos)

Do longo poema em quatro cantos do autor francês, aqui estão, vertidos ao português pelo literato Claudio Veiga, alguns versos extraídos aos cantos de I a III: são como que recomendações e sentenças – um autêntico tratado para os versos clássicos – dirigidas a quem pretende se dedicar à poética, essa sublime arte da beleza na linguagem.

 

Segundo os preceitos de Boileau, para que alguém se proponha a escrita de uma obra poética em bons termos, vale o respeito à clareza do pensamento, bem assim à contenção e à precisão da linguagem empregada, sendo o esquema de rimas um recurso a reboque para se desenvolver um dado assunto – agradável ou sublime –, limitados convenientemente em termos de tempo e lugar.

 

J.A.R. – H.C.

 

Nicolas Boileau

(1636-1711)

Busto por François Girardon

 

L’Art Poétique (Extraits)

 

Quelque sujet qu’on traite, ou plaisant, ou sublime,

Que toujours le bon sens s’accorde avec la rime:

L’un l’autre vainement ils semblent se haïr;

La rime est une esclave et ne doit qu’obéir.

 

 

Aimez donc la raison: que toujours vos écrits

Empruntent d’elle seule et leur lustre et leur prix.

 

 

Qui ne sait se borner ne sut jamais écrire.

 

 

Enfin Mallherbe vint, et, le premier en France,

Fit sentir dans les vers une juste cadence,

D’un mot mis en sa place enseigna le pouvoir,

Et réduisit la Muse aux règles du devoir.

Par ce sage écrivain la langue réparée

N’offrit plus rien de rude à l’oreille épurée.

Les stances avec grâce apprirent à tomber,

Et le vers sur le vers n’osa plus enjamber.

Tout reconnut ses lois; et ce guide fidèle

Aux auteurs de ce temps sert encor de modèle.

 

 

Avant donc que d’écrire, apprenez à penser.

 

 

Hâtez-vous lentement, et, sans perdre courage,

Vingt fois sur le métier remettez votre ouvrage:

Polissez-le sans cesse et le repolissez;

Ajoutez quelquefois, et souvent effacez.

 

 

Un sonnet sans défaut vaut, seul, un long poème.

 

 

Un rimeur, sans péril, delà les Pyrénées,

Sur la scène en un jour renferme des années.

Là, souvent, le héros d’un spectacle grossier,

Enfant au premier acte, est barbon au dernier.

Mais nous, que la raison à ses règles engage,

Nous voulons qu’avec art l’action se ménage;

Qu’en un lieu, qu’en un jour, un seul fait accompli

Tienne jusqu’à la fin le théâtre rempli.

 

Cavaleiro no Umbral

(Ganesh Pyne: artista indiano)

 

A Arte Poética (Excertos)

 

Qualquer que seja o assunto, engraçado ou sublime,

Deve nele casar o bom senso com a rima.

Parece, em vão, que os dois não se dão muito bem:

Cabe à rima servir, sendo simples escrava.

 

 

Amai, pois, a razão e dela tão somente

Venha o brilho e o valor que houver em vossos livros.

 

 

Quem não sabe conter-se não sabe escrever, nunca soube.

 

 

Enfim chegou Malherbe e, por primeiro, em França,

Nos versos fez sentir uma justa cadência,

E no texto o lugar que realça a palavra,

A rima reduzindo às regras do dever.

Pelo sábio escritor, a língua reparada,

Nunca mais ofendeu ouvidos afinados;

As estrofes, com graça, a cair aprenderam,

E não mais cavalgou o verso sobre o verso.

Aceita a sua lei, esse exemplo seguro

De modelo inda serve a quem tenta escrever.

 

 

Antes, pois, de escrever aprendei a pensar.

 

 

Dai pressa lentamente e sem desfalecer;

Vinte vezes voltai à mesa de trabalho,

Vosso escrito polindo e sempre repolindo;

Às vezes acrescei, sobretudo apagai.

 

 

Longo poema vale um soneto sem falha.

 

 

Um rimador, impune, além dos Pireneus,

Num dia só, na cena, abarca muitos anos.

Lá, quanta vez, o herói de grosseiro espetáculo,

É menino ao começo e velho ao fim da peça.

Mas, nós, pela razão, às regras apegados,

Nós queremos que a ação, com arte, se desdobre,

Num só lugar, num dia, um fato se conclua

E, até o fim, mantenha o teatro repleto.

 

Referência:

 

BOILEAU, Nicolas. L’art poétique. Tradução de Cláudio Veiga. In: VEIGA, Cláudio (Seleção, organização e tradução). Antologia da poesia francesa: do século IX ao século XX. Edição bilíngue: francês x português. 1. ed. Rio de Janeiro, RJ: Record, 1991. Em francês: p. 128 e 130; em português: p. 129 e 131.

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