Na semântica da
escritora, tradutora e poetisa gaúcha, o que resta consignado para uma palavra
também comporta o seu oposto, seu antônimo, porque o mundo é toda essa manifesta
dualidade fenomênica, a conglobar, por extensão, os signos linguísticos das
representações que atribuímos aos elementos da natureza.
Se a voz lírica fala
“morte”, por conseguinte, pretende reforçar o que seja a vida, seu polo oposto.
E não há que se procurá-la, dilucidá-la, esclarecê-la nas linhas, nas páginas
dos livros, pois logo sobrevém outro giro semântico, e aquilo que deveria se
mostrar ostensivo aos olhos, passa à escala de ocultação entre as linhas, de
disfarce que, a todo transe, revela um inaudito poder de sedução.
J.A.R. – H.C.
Lya Luft
(1938-2021)
Semântica
Não se enganem
comigo:
se digo sul pode ser
norte,
chego mas fico
ausente,
o triste é também o
belo,
procuro o que não se
perde
nem se pode
encontrar.
Buscar resposta nos
livros
é esconder-se entre
linhas.
Não creio no que se
enxerga,
mas nisso que se
disfarça
por mais que se tente
olhar:
assim me tem
seduzida.
Eis o jogo que eu
persigo,
meu jeito de ser
feliz,
o desafio que me
embala:
sempre que escrevo “morte”
estou falando da
vida.
Morte e Vida
(Gustav Klimt: pintor
austríaco)
Referência:
LUFT, Lya. Semântica. In: __________. Para não dizer adeus. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Record, 2005. p. 133.
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