Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Paul Verlaine - A voz dos botequins...

A zoeira dos cabarés atrai o falante, e o caminho que leva até lá mostra-se tão degradado quanto o ambiente daquelas boates, as quais se lhe revelam como um “paraíso”: trata-se, designadamente, de um espírito “decaído”, amante da vida boêmia, libertina, desregrada, que se compraz no vício – muito à maneira do próprio Verlaine.

 

Seja lá como for, vazado em sua sonoridade e no esquema de rimas parelhas, o poema comporta certa espécie de beleza – espectral, dir-se-ia –, nada convencional nas imagens evocadas, nos retentivos matizes do preto, do vermelho e do verde, na anamnese da paisagem urbana exulcerada, poluída, inquinada por tétricos senões por onde, mundano às lufadas, vagueia o ente lírico.

 

J.A.R. – H.C.

 

Paul Verlaine

(1844-1896)

 

Le bruit des cabarets...

 

Le bruit des cabarets, la fange des trottoirs,

Les platanes déchus s’effeuillant dans l’air noir,

L’omnibus, ouragan de ferraille et de boues,

Qui grince, mal assis entre ses quatre roues,

Et roule ses yeux verts et rouges lentement,

Les ouvriers allant au club, tout en fumant

Leur brûle-gueule au nez des agents de police,

Toits qui dégouttent, murs suintants, pavé qui glisse,

 

Bitume defoncé, ruisseaux comblant l’égout,

Voilà ma route – avec le paradis au bout.

 

Cabaré

(Rayisa Tanska: artista ucraniana)

 

A voz dos botequins...

 

A voz dos botequins, a lama das sarjetas,

Os plátanos largando no ar as folhas pretas,

O ônibus, furacão de ferragens e lodo,

Que entre as rodas se empina e desengonça todo,

Lentamente, o olhar verde e vermelho rodando,

Operários que vão para o grêmio fumando

Cachimbo sob o olhar de agentes de polícia,

Paredes e beirais transpirando imundícia,

 

A enxurrada entupindo o esgoto, o asfalto liso,

Eis meu caminho – mas no fim há um paraíso.

 

Referência:

 

VERLAINE, Paul. Le bruit des cabarets... / A voz dos botequins... Tradução de Guilherme de Almeida. In: ALMEIDA, Guilherme de (Seleção e tradução). Poetas de França. Prefácio de Marcelo Tápia. 5. ed. São Paulo, SP: Babel, 2011. Em francês: p. 92; em português: p. 93.

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