Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Rainer Maria Rilke - Não posso acreditar que a pequena morte

O receio de morrer não pode obliterar a disposição para viver, pois, do contrário, deixaremos de fazer diferença no mundo – realizar ações significativas que possam ser de valia para os que aqui permanecem –, ou mesmo de saber valorizar as pequenas e belas coisas da existência, antes de partirmos em definitivo para uma outra morada.

 

Pensar na morte não pode ser uma obsessão, mas tem lá sua importância para darmos proveito ao tempo que ainda nos resta, aos nossos relacionamentos, ao refinamento de nossa própria identidade, de nosso “eu” profundo: um tempo de transformação espiritual, de abertura à beleza do sagrado em todos nós, para trilharmos um caminho até a unicidade portadora da mensagem do que seja verdadeiro e real (ainda que pelo vislumbre de olhos tão limitados, em razão de nossa medida “humana”).

 

J.A.R. – H.C.

 

Rainer Maria Rilke

(1875-1926)

 

Ich kann nicht glauben, daß der kleine Tod

 

Ich kann nicht glauben, dass der kleine Tod,

dem wir doch täglich übern Scheitel schauen,

uns eine Sorge bleibt und eine Not.

 

Ich kann nicht glauben, dass er ernsthaft droht;

ich lebe noch, ich habe Zeit zu bauen:

mein Blut ist länger als die Rosen rot.

 

Mein Sinn ist tiefer als das witzige Spiel

mit unsrer Furcht, darin er sich gefällt.

Ich bin die Welt,

aus der er irrend fiel.

 

Wie er

kreisende Mönche wandern so umher;

man fürchtet sich vor ihrer Wiederkehr,

man weiß nicht: ist es jedesmal derselbe,

sind’s zwei, sind’s zehn, sind’s tausend oder mehr?

Man kennt nur diese fremde gelbe Hand,

die sich ausstreckt so nackt und nah –

da da:

als käm sie aus dem eigenen Gewand.

 

In: Erstes Buch - Das Buch vom Mönchischen Leben (1899)

 

Natureza-morta com equipamento

de tiro e flores II

(Jean-Baptiste Oudry: pintor francês)

 

Não posso acreditar que a pequena morte

 

Não posso acreditar que a pequena morte,

a quem vemos diariamente por cima dos ombros,

ainda seja para nós motivo de inquietude e sofrimento.

 

Não posso acreditar que nos assedia seriamente;

Ainda estou vivo, tenho tempo para projetos:

meu sangue será vermelho por mais tempo que as rosas.

 

Mais profundo é meu propósito do que o engenhoso jogo

com nossos medos em que ela se compraz.

Eu sou o mundo,

fora do qual ela, errante, tombou.

 

Como ela,

os monges, em círculos, vagueiam no entorno;

teme-se o seu regresso,

já não se sabe: é sempre o mesmo a cada vez,

são dois, são dez, são mil ou mais?

Tudo o que se conhece é essa estranha mão amarelada,

que tão perto e nua se estende –

ali, ali:

como se emergisse de nossas próprias vestes.

 

Em: Primeiro Livro - O Livro da Vida Monástica (1899)

 

Referência:

 

RILKE, Rainer Maria. Ich kann nicht glauben, daß der kleine tod. In: __________. Das stunden-buch. Frankfurt am Main, DE: Insel Verlag, 1955. s. 28-29.

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