Temos aqui dois instantâneos da poesia, de alto teor concentrado em
poucas palavras, do poeta paranaense, ambas às voltas com rápidas reflexões sobre
a arte mesma de criar poemas, lídimas flores que emergem da imaginativa mente humana,
ainda que submetida esteja às mais vis torturas.
Enquanto no primeiro poema Leminski questiona-se sobre a necessidade de
se fundamentar a poesia em sólidas razões para que possa ela existir, na
segunda volta-se ao seu próprio modo de criá-la, com poucas modificações sobre
aquilo que já estiver registrado no papel, haja vista que, segundo lhe parece –
ou melhor, uma parte de si mesmo desprezada pela outra –, trata-se de um máximo
que já terá atingido o status de “clássico”.
J.A.R. – H.C.
Paulo Leminski
(1944-1989)
razão de ser
(LEMINISKI, 2017, p. 58)
Escrevo. E pronto.
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou
tonto.
Ninguém tem nada com
isso.
Escrevo porque
amanhece,
e as estrelas lá no
céu
lembram letras no
papel,
quando o poema me
anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde
o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?
poesia: 1970
(LEMINISKI, 2017, p.
70)
Tudo o que eu faço
alguém em mim que eu
desprezo
sempre acha o máximo.
Mal rabisco,
não dá mais pra mudar
nada.
Já é um clássico.
Em: “ais ou menos”
Figura em Paisagem
(Cândido Portinari:
pintor brasileiro)
Referência:
LEMINSKI, Paulo. Distraídos venceremos. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras,
2017. (‘Poesia de Bolso’)
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