Um ano novo que se parece a um jardim, o qual, se ponderarmos no plano
fático e não no metafórico, só se dignará a desabrochar em flor nesta época do
ano, em lento movimento, caso no hemisfério sul: latejam no horto os segredos
das notícias por vir, a se traduzirem em estrelas capazes de retratar os nossos
mais recônditos desejos.
Para cada ponto cadente, lídimo pássaro estelar, ascende do solo um confidencial
pedido: que a nossa sorte de ontem se mantenha – caso positiva –, e que se reverta
a momentos de ventura nos próximos doze meses – se desfavorável.
J.A.R. – H.C.
Dora Ferreira da Silva
(1918-2006)
Ano Novo
Prepara-se o jardim.
Há um movimento do
botão à flor
em câmera lenta.
O rosto pequeno das
violetas
esconde seu perfume
nas folhas
sussurrando segredos.
Salta o sabiá na
aragem
e suplica à rosa de
ontem
que não desfolhe seu
rubor.
Promete a nova noite
a estrela que
quisermos.
O CISNE – constelação
que amamos –
cintila noutro céu.
Entre ar e folhagem
o pedido calado
alcança
um pássaro estelar.
Em: “Poemas da estrangeira –
Ciclo da montanha” (1995)
O Grande Cometa de 1860
sobre Roterdã
(Lieve Verschuier:
pintor holandês)
Referência:
FERREIRA DA SILVA, Dora. Ano novo. In: __________. Poesia reunida. Rio de Janeiro, RJ: Topbooks, 1999. p. 291.
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