Com três estrofes rápidas, com anáforas nos primeiros versos associadas
à poesia – tema muito íntimo do vate, a ponto de invocá-la por “tu” –, o poeta
venezuelano Otero Silva apresenta-nos, como muitos aqui, o seu conceito sobre o
que seja a poesia. Poesia sobre poesia...
Poesia “nascida para o homem e sua linguagem”: esquiva, recôndita, inaudível
e às proximidades dos abismos, a ser sorvida com a urgência da vida. Poesia que
escasseia no deserto, mas que emerge essencial como um oásis.
J.A.R. – H.C.
Miguel Otero Silva
(1908-1985)
La Poesía III
Tú, poesía,
sombra más misteriosa
que la raíz oscura de
los añosos árboles,
más del aire
escondida
que las venas
secretas de los profundos minerales,
lucero más recóndito
que la brasa
enclaustrada en los arcones de la tierra.
Tú, música tejida
por el arpa inaudible
de las constelaciones,
tú, música espigada
al borde de los
últimos precipicios azules,
tú, música engendrada
al tam-tam de los
pulsos y al cantar de la sangre.
Tú, poesía,
nacida para el hombre
y su lenguaje,
no gaviota
blanquísima sobre un mar sin navíos,
ni hermosa flor
erguida sobre la llaga de un desierto.
O Sonho do Poeta
(Paul Cézanne:
1839-1906)
A Poesia III
Tu, poesia,
sombra mais
misteriosa
que a raiz escura das
centenárias árvores,
mais escondida do ar
que as veias secreta
dos profundos minerais,
facho mais recôndito
que a brasa enclaustrada
nas arcas da terra.
Tu, música tecida
pela harpa inaudível
das constelações,
tu, música espigada
à borda dos últimos
precipícios azuis,
tu, música engendrada
ao tam-tam dos pulsos
e ao cantar do sangue.
Tu, poesia,
nascida para o homem
e sua linguagem,
não branquíssima
gaivota sobre um mar sem navios,
nem formosa flor
erguida sobre a chaga de um deserto.
Referência:
OTERO SILVA, Miguel. La poesia III. In:
JIMENÉZ, José Olivio (Selección, prólogo y notas). Antología de la poesía hispanoamericana contemporánea: 1914-1970.
7. ed. Madrid, ES: Alianza Editorial, 1984. p. 394. (El Libro del Bolsillo)
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