O derradeiro
poema, do poeta cearense Antônio Girão, apenas por palavras se parece a tantos
outros que brilham no campo da literatura. Mas não só: o que o torna singular é
a substância que o compõe, da mesma tessitura da própria vida, do homem, da sua
pequenez à sua grandeza.
Um longo apito de
uma locomotiva, um passeio vespertino de bonde: notemos o quanto fugaz é essa
experiência, que fende a seta do tempo. Um nada, no breve interregno em que a
massa de uma ampulheta flui de cima a baixo de seus dois cones invertidos.
Mas uma
experiência que deixa os seus efeitos sobre a memória dos que lhe são
contemporâneos ou que virão depois. Um apito que tem o dom de, em sua
fugacidade, perdurar no tempo!
J.A.R. – H.C.
Antônio Girão
Barroso
(1914-1990)
Último poema
O que está por
trás do poema e da poesia do poema
é o homem e sua
vida
sua sobrevida
sua suada subvida
o homem e suas
circunstâncias
plantado no
espaço
no tempo que vai
p a s s a n d o
O homem e suas
(in)finitudes
um olhar breve –
e vão
um apito – longo
– de locomotiva
um passeio à
tarde – de bonde
O último poema
(Claude Raguet
Hirst: artista norte-americano)
Referência:
BARROSO, Antônio
Girão. Último poema. In: PINTO, José Nêumanne (Sel.). Os cem melhores poetas
brasileiros do século. São Paulo, SP: Geração, 2001. p. 71.
❁
Sendo filha do AGB, venho lhe agradecer por esta lembrança do grande e inspirado poeta, que tanto me ensinou sobre a vida e como escapar das armadilhas que encontramos pelo caminho. Antônio foi, sobretudo, um amante da Poesia de grandes como Rimbaud e Baudelaire. Ele gostava demais da literatura francesa e se deixou influenciar por ela. Salve, Girãozinho !!
ResponderExcluirPrezada,
ResponderExcluirNão há por que agradecer. Aliás, este blogueiro é que tem muito a agradecer a todos os poetas que nos legaram as suas belas criações, para que possamos sobre elas refletir – o seu genitor, claro está, aí incluso.
Um grande abraço,
João A. Rodrigues