A qual tipologia humana Quasimodo estaria a referir-se quando apõe o título acima ao seu poema? Alguma dúvida? Não poderia ser senão àquele homem que acabara de engendrar duas guerras mundiais, no decurso das quais – distantemente dos interesses de ordem econômica que, em tese, levaram a cabo tais conflitos – foram perpetrados os mais vis morticínios.
Os versos estão pejados de afinidades intertextuais com as crônicas das Escrituras, mormente com aquelas em que resulta vertido o sangue dos justos, atualizadas, séculos depois, pelo sórdido manejo da ciência, em estágio avançado, a apoiar ações miríades de vezes mais potentes, para lograr dissuadir os oponentes mediante um devastador poder de destruição.
J.A.R. – H.C.
Salvatore Quasimodo
(1901-1968)
Uomo del mio tempo
Sei ancora quello della pietra e della fionda,
uomo del mio tempo. Eri nella carlinga,
con le ali maligne, le meridiane di morte,
– t’ho visto – dentro il carro di fuoco, alle
forche,
alle ruote di tortura. T’ho visto: eri tu,
con la tua scienza esatta persuasa allo sterminio,
senza amore, senza Cristo. Hai ucciso ancora,
come sempre, come uccisero i padri, come uccisero,
gli animali che ti videro per la prima volta.
E questo sangue odora come nel giorno
quando il fratello disse all’altro fratello:
“Andiamo ai campi”. E quell’eco fredda, tenace,
è giunta fino a te, dentro la tua giornata.
Dimenticate, o figli, le nuvole di sangue
salite dalla terra, dimenticate i padri:
le loro tombe affondano nella cenere,
gli uccelli neri, il vento, coprono il loro cuore.
Da: “Giorno dopo Giorno” (1947)
Caim assassina Abel
(Pietro Novelli: pintor italiano)
Homem do meu tempo
És ainda aquele da pedra e da funda,
homem do meu tempo. Estavas na carlinga,
com as asas malignas, as meridianas de morte,
– sim, te vi – dentro do carro de fogo, nas forcas,
nas rodas de tortura. Sim, te vi: eras tu,
com a tua ciência exata dirigida ao extermínio,
sem amor, sem Cristo. Mataste, ainda,
como sempre, como mataram os pais, como os
animais que te viram pela primeira vez.
E este sangue odora como no dia
que o irmão disse ao outro irmão:
“Vamos aos campos”. E aquele eco frio, tenaz,
chegou até os teus ouvidos, na tua jornada.
Esquecei, ó filhos, as nuvens de sangue
crescidas da terra, esquecei os avós:
os seus túmulos afundam nas cinzas,
os pássaros negros, o vento, lhes cobrem o coração.
De: “Dias após Dia” (1947)
Referências:
Em Italiano
QUASIMODO, Salvatore. Uomo del mio tempo. In: __________. Poesie scelte di Salvatore Quasimodo. A cura di Roberto Sanesi. 2. ed. Parma, IT: Guanda, 1960. p. 88. (‘Piccola Fenice’; n. 1)
Em Português
QUASIMODO, Salvatore. Uomo del mio
tempo / Homem do meu tempo. Tradução de Sílvio Castro. In: __________. Poesias
escolhidas. Tradução de Sílvio Castro. Rio de Janeiro, RJ: Opera Mundi,
1971. p. 141. (Biblioteca dos Prêmios Nobel de Literatura patrocinada pela
Academia Sueca e pela Fundação Nobel; Prêmio de 1959: Salvatore Quasimodo,
Itália)
Ótimo!
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