O poeta emprega a imagem comumente difundida do mar para evocar uma
espécie de partida de sua vida cotidiana: diz ele que gostaria de fugir para um
lugar onde as aves já planem bêbadas por estar entre a espuma do alto-mar e a
imensidão dos céus.
Há certa sensação eclesiástica de frustração advinda do cansaço:
tornaram-se fracos o espírito e a carne, o compromisso de livros por ler ou
escrever começa a parecer inoportuno ou enfadonho. Disso tudo resultou
insatisfação e não contentamento. O poeta oscila entre polos de esperança e desapontamento
nessa aventura pelágica, que também é a vertente metafórica da aventura poética.
J.A.R. – H.C.
Stéphane Mallarmé
(1842-1898)
Brise marine
La chair est triste,
hélas! et j’ai lu tous les livres.
Fuir! là-bas fuir! Je
sens que des oiseaux sont ivres
D’être parmi l’écume
inconnue et les cieux!
Rien, ni les vieux
jardins reflétés par les yeux
Ne retiendra ce coeur
qui dans la mer se trempe
Ô nuits! ni la clarté
déserte de ma lampe
Sur le vide papier
que la blancheur défend
Et ni la jeune femme
allaitant son enfant.
Je partirai! Steamer
balançant ta mâture,
Lève l’ancre pour une
exotique nature!
Un Ennui, désolé par
les cruels espoirs,
Croit encore à
l’adieu suprême des mouchoirs!
Et, peut-être, les
mâts, invitant les orages,
Sont-ils de ceux
qu’un vent penche sur les naufrages
Perdus, sans mâts,
sans mâts, ni fertiles îlots…
Mais, ô mon coeur,
entends le chant des matelots!
Brisa do Mar do Norte na Costa Holandesa
(Edward William Cooke:
pintor inglês)
Brisa marinha
A carne é triste, e
eu li todos os livros, todos.
Fugir! Além! Eu sei
que há pássaros já doidos
Por se ver entre os
céus e a espuma do alto-mar!
Nada, nem os jardins
refletidos no olhar,
Retém meu coração que
já no mar se aninha,
Nem, ó noites, a luz
da lâmpada sozinha
Sobre o papel vazio,
intangível de brilho,
E nem a mulher moça
amamentando o filho.
Hei de partir! Vapor
de mastros oscilantes,
Ergue a âncora para
regiões extravagantes!
Um Tédio desolado,
entre anseios intensos,
Ainda acredita no
supremo adeus dos lenços!
E esse mastros,
talvez, cheios de maus presságios,
São dos que um vento
faz vagar sobre os naufrágios
Sem ilhas férteis e
sem mastros de veleiros…
Mas, ó minha alma,
ouve a canção dos marinheiros!
Referência:
MALLARMÉ, Stéphane. Brise marine /
Brisa marinha. Tradução de Guilherme de Almeida. In: ALMEIDA, Guilherme
(Seleção e Tradução). Poetas de França.
Prefácio de Marcelo Tápia. 5. ed. São Paulo, SP: Babel, 2011. Em francês: p.
78; em português: p. 79.
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Muito bacana a leitura que você propõe para esse texto do Mallarmé. Muito obrigado por compartilhar!
ResponderExcluirPrezado Leo,
ExcluirAgradeço pelo comentário e por navegar pelas páginas do blog.
Um abraço,
João A. Rodrigues