Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 3 de fevereiro de 2018

Antonio Miranda - Poética

O poeta fala de seu ofício. Ou melhor, de como se deve interpretar o resultado de seu ofício – o poema –, que, saído de suas mãos, já não lhe pertence ante a imaginação e os caprichos do leitor, artífice dos inúmeros modos de articular a matéria que lhe assoma ao espírito, em colação aos versos que os seus olhos miram na página.

A poesia, assim, é mais de quem lê o poema do que quem o escreve, afirma-o Miranda, pois as palavras vão além do próprio signo linguístico, expandindo-se em tessituras, sinestesias, ventriloquia. E então retornamos ao próprio poeta: além de um pessoano “fingidor”, eis aí mais uma definição do bardo – um ventríloquo!

J.A.R. – H.C.

Antonio Miranda
(n. 1940)

Poética

Para Trina Quiñones

Um menino me disse
– mas estava enganado –
gostar de poesia porque
ele lia tudo rapidinho.

Ledo engano: quanto menor
o poema, mais denso
requer pausas, releituras
cruzar os pensamentos.

Ler no espaço das palavras
além das formas/ideias
não ler as palavras
mas sua tessitura interna.

A poesia é mais de quem lê
do que de quem escreve
– o poema circunscreve
um universo qualquer.

Todo poema é hermético
requer um cerco desvendar
porque o poeta-ventríloquo
fala pela boca de outrem.

Palavras-coisas, lapidais.
Palavras-pessoas, além
de si mesmas – outras
– palavras homologais

mesmo as circunstanciais
cifradas no eu-mesmo
da poesia do circunlóquio
que se liberta e ganha

espaço.

Interpretação de um Poema
(Margareth Osju: artista brasileira)

Referência:

MIRANDA, Antonio. Poética. In: __________. Retratos & poesia reunida. Brasília, DF: Thesaurus, 2004. p. 56-57.

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