O poeta emprega metáforas ligadas à natureza para abordar a poesia que,
aflorando de fato em seu espírito, estaria ligada a atributos de sua amada,
transbordando em seus olhos, desprendendo de seu corpo como se este fosse uma
árvore a desafiar a eternidade.
Schmidt imprime maior acento ao sentido da visão, atravessado
por toda a massa pletórica de sentimentos e pensamentos que vagueiam pelo
espírito humano, em específico, o da companheira do poeta. Depois, tríplice
menção à voz, no caso, vibrante, molhada e estremecida. E ao fim, transformada
numa flor escura, a amada adormece e, durante o sono, a poesia nele
mergulha e se aprofunda.
“Flor escura”? O que quereria dizer o poeta? Uma beleza que não reflete
a sua luz? Ou seria o fato contingente de ela estar estirada ao leito, num
recinto escuro? Ou ainda, em razão dos olhos e lábios fechados, a poesia não se
deixar externar, senão apenas vagar num interior imperscrutável?!
J.A.R. – H.C.
Augusto Frederico Schmidt
(1906-1965)
Caricatura de Ramon Muniz
A Poesia
A poesia flutua nos
teus olhos.
É uma luz que nasce
Do teu ser, do teu
espírito,
E floresce nos teus olhos.
A poesia se desprende
de ti, oh! árvore
De raízes fixadas no
eterno.
A poesia vibra na tua
voz, perpassa na tua voz.
Atravessa a tua voz
molhada, veemente.
A poesia agita,
estremece a tua voz
Como o vento do largo
às velas dos navios
E as asas dos
pássaros.
A poesia ronda o teu
sono
E nele mergulha e se
aprofunda
Quando adormecida te
transformas numa flor escura.
Azulões e Pêssegos
(Crista Forest:
pintora norte-americana)
Referência:
SCHMIDT, Augusto Frederico. A poesia.
In: __________. 50 poemas escolhidos
pelo autor. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura / Serviço de
Documentação; Departamento de Imprensa Nacional, 1957. p. 9. (“Os Cadernos de
Cultura; v. 98)
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