Num poema aparentemente singelo e descritivo, a poetisa coloca em
primeiro plano a questão racial nos EUA, opondo uma provável pessoa de tez
negra – a quem designa de “tia” – e uma criança branca, possivelmente do sexo
feminino –, caracterizações que se podem deduzir do tabaco consumido pela
primeira e do diálogo nos versos iniciais do poema, bem assim as meias até os
joelhos em uso pela segunda.
Ficamos sabendo que a tia entrega um chapéu à criança para que se
proteja do sol – e não altere demais o tom de sua pele, poder-se-ia deduzir! E
vejamos as derradeiras linhas expressas: a tia pesca um linguado e tece
comentários sobre um fato natural, mas ao qual se atribui um enfoque
valorativo, a saber, que a parte superior do peixe é escura e a inferior
branca. Observação gratuita? De modo algum! A autora do poema é mestiça, filha
de mãe negra e pai branco.
J.A.R. – H.C.
Natasha Trethewey
(n. 1966)
Flounder
Here, she said, put this on your head.
She handed me a hat.
You ’bout as white as your dad,
and you gone stay like that.
Aunt Sugar rolled her
nylons down
around each bony
ankle,
and I rolled down my
white knee socks
letting my thin legs
dangle,
circling them just
above water
and silver backs of
minnows
flitting here then
there between
the sun spots and the
shadows.
This is how you hold the pole
to cast the line out straight.
Now put that worm on your hook,
throw it out and wait.
She sat spitting
tobacco juice
into a coffee cup.
Hunkered down when
she felt the bite,
jerked the pole
straight up
reeling and tugging
hard at the fish
that wriggled and
tried to fight back.
A flounder, she said, and you can tell
’cause one of its sides is black.
The other side is white, she said.
It landed with a
thump.
I stood there
watching that fish flip-flop,
switch sides with
every jump.
Mulheres Pescando
(Georges d’Espagnat:
pintor francês)
O Linguado
Olha aqui, disse-me ela, põe isto em tua cabeça.
Entregou-me um
chapéu.
És quase tão branca quanto teu pai,
e vais continuar assim.
Tia Mel enrolou os
seus náilons
à volta de cada
tornozelo ossudo.
E eu baixei minhas
meias 5/8 brancas
deixando pender as
pernas magras,
movendo-as em
círculos pouco acima da água,
onde os vairões com
os seus dorsos prateados
pinchavam daqui para
ali entre
os feixes de sol e as
sombras.
Assim é como deves segurar a vara
para lançar a linha em percurso reto.
Agora põe esta larva em teu anzol,
arremessa-a longe e aguarda.
Sentou-se a expelir sumo
de tabaco
em uma xícara de
café.
Agachou-se quando
sentiu a mordida,
retesou a vara
diretamente para cima,
erguendo-se e puxando
fortemente o peixe
que se contorceu e
tentou resistir.
Um linguado, disse, e se pode afirmá-lo
por ser escuro um de seus lados.
Branco é o outro lado, arrematou.
Foi ao chão com um
ruído surdo.
Fiquei ali a observar
aquele flip-flop do peixe,
Mudando de lado a
cada salto.
Referência:
TRETHEWEY, Natasha. Flounder. In:
DOVE, Rita (Ed.). The penguin anthology
of twentieth century american poetry. New York, NY: Penguin Books, 2013. p.
559-260.
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