Embora não se tenha
aqui o inteiro teor deste longo poema de Maiakóvski – composto pelo
infratranscrito prólogo, uma dedicatória e cinco seções (v. link no campo de
referências) –, deduz-se pelo título, desde logo, um insuspeito espectro temático,
que vai da gravidade da guerra à valentia nos campos de batalha, da vida que se
defende à morte por toda parte.
O falante, à maneira
de um soldado, expressa as suas ideias de modo apaixonado e desafiador, confrontando
o pragmatismo e a trivialidade da vida quotidiana com o poder letal do conflito
– a obstaculizar a expressão do amor –, sugerindo, com desapego, que a morte
tem o poder de nos libertar das preocupações e dos pecados terrenais.
Declarando-se um “arauto
das verdades futuras”, o ente lírico enfatiza, ademais, o seu papel de
mensageiro da verdade e da justiça em meio ao caos que se instala com a refrega,
resistindo à conformidade e à complacência daqueles que não estão diretamente
envolvidos nos combates.
J.A.R. – H.C.
Vladímir Maiakóvski
(1893-1930)
Война и мир
Пролог
Хорошо вам.
Мертвые сраму не имут.
Злобу
к умершим убийцам туши.
Очистительнейшей влагой вымыт
грех отлетевшей души.
Хорошо вам!
А мне
сквозь строй,
сквозь грохот
как пронести любовь к живому?
Оступлюсь —
и последней любовишки кроха
навеки канет в дымный омут.
Что́ им,
вернувшимся,
печали ваши,
что́ им
каких-то стихов бахрома?!
Им
на паре б деревяшек
день кое-как прохромать!
Боишься?!
Трус!
Убьют?!
А так
полсотни лет еще можешь, раб, расти.
Ложь!
Я знаю,
и в лаве атак
я буду первый
в геройстве,
в храбрости.
О, кто же,
набатом гибнущих годин
званый,
не выйдет брав?
Все!
А я
на земле
один
глашатай грядущих правд.
Сегодня ликую!
Не разбрызгав,
душу
сумел,
сумел донесть.
Единственный человечий,
средь воя,
средь визга,
голос
подъемлю днесь.
А там
расстреливайте,
вяжите к столбу!
Я ль изменюсь в лице!
Хотите –
туза
нацеплю на лбу,
чтоб ярче горела цель?!
(1915-1916)
Guerra e paz
(Peter Proksch:
pintor austríaco)
Guerra e paz (*)
Prólogo
Vós outros tendes
sorte.
A vergonha não cai
sobre os mortos.
Logo cessais
de odiar os
assassinos mortos.
Julgais
que o mais puro dos
líquidos lava
o pecado da alma que
se evola.
Tendes sorte.
Mas eu
como levarei meu amor
à vida
através das fileiras,
através do estrondo?
Apenas um passo em
falso
e a migalha do último
e pequenino amor
rolará para sempre
num torvelinho de fumo.
Aqueles que regressam
que lhes importa
vossas tristezas?
Que falta lhes faz
a franja de alguns
versos?
Basta-lhes um par de
muletas
com que renguear pelo
resto da vida.
Tens medo?
Covarde!
Te matarão!
E tu,
tu poderias viver
escravo
cinquenta anos mais.
Mentira!
Sei
que na lava do ataque
serei o primeiro
em audácia,
em valor.
Ah! que bravo
recusaria atender
ao toque de rebate do
futuro?
Mas na terra
hoje
sou o único arauto
das verdades em marcha!
Hoje estou exultante!
Sem desperdiçar nem
uma gota,
despejei minh’alma
até o fim.
Minha voz,
a única humana,
entre lamentos e
gemidos
ergue-se à luz do
dia.
Depois
atai-me a um poste,
fuzilai-me!
Por causa disso
haverei de mudar?
Na fronte
desenharei um alvo
para que nítido se
destaque
quando apontem.
(1915-1916)
Nota:
(*). Trata-se de um
longo poema, do qual, nesta postagem, vai apenas o seu prólogo.
Referências:
МАЯКОВСКИЙ, Владимир. Война и мир: пролог. Disponível neste
endereço. Acesso em: 18 jan. 2025.
MAIAKÓVSKI, Vladímir.
Guerra e paz: prólogo. Tradução de Emilio Carrera Guerra. In: __________. O
poeta-operário: antologia poética. Tradução e estudo biográfico de Emílio
Carrera Guerra. São Paulo, SP: Círculo do Livro, 1991. p. 124-125.
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