Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Alfredo Veiravé - Madame Bovary

O poeta argentino faz uma reinterpretação contemporânea, ao mesmo tempo crítica e compassiva, da tragédia em que envolta a protagonista do romance homônimo de Gustave Flaubert (1821-1880): a seu ver, a tentativa de escapar à solidão levou Emma a um amplificado fracasso, dir-se-ia até inevitável, do que se a tivesse tomado por algo pessoal e exclusivo. Com efeito, sem as ferramentas para vogar pelas complexas águas da vida, a senhorinha acabou por submergir num vórtice arrasador de liberdade sem freios e de paixões sinistras.

 

Carente de compreensão e de conexão emocional, numa sociedade com mentalidade conservadora e repressiva, Madame Bovary teria sido vítima das expectativas sociais e de gênero impostas às mulheres de seu tempo. Para atenuar os tormentos de Emma, o falante lhe propõe que encontre consolo junto à cultura popular hodierna – adotando, v.g., a postura da contracultura hippie dos anos 60 ou, ainda, ouvindo as composições dos Beatles –, longe, por conseguinte, das imposições restritivas do contexto social provinciano em que a protagonista, de fato, vivera.

 

J.A.R. – H.C.

 

Alfredo Veiravé

(1928-1991)

 

Madame Bovary

 

Emma te equivocaste

cuando saliste de tu casa en un carruaje con grandes

ruedas que corrían hacia atrás como en las películas del

Oeste

porque tu soledad era algo que debía ser solamente tuya

y porque era fatal que

nadie te comprendiera en ese pueblo de provincias

ni siquiera tu marido

el pobre hombre gris herido de tu amor

Bueno no me hables ahora de tus taquicardias

o de los vestidos con enaguas y encajes

déjame explicarte

que me conduelo solamente

porque te perseguían furiosamente

los vecinos ineptos en el juego

de tu corazón virgen

y tu siglo era un cambio

lentamente mirado a través de las celosías

de la villa

más bien ponte el anillo o los collares de los hippies

y piensa en Carnaby Street en cómo lograr la infidelidad

sin que tengas que recurrir a tu conciencia

de pobre muchacha provinciana

Yo pienso que buscabas saber solamente

cómo te desnudarían los otros

y estos otros cretinos te traicionaron

 Emma

Dame la mano no llores más

quédate en silencio

y escuchemos juntos estos discos de los Beatles

 

Jovem num barco

(James Tissot: pintor francês)

 

Madame Bovary

 

Emma, cometeste um erro

quando saíste de casa numa carruagem com grandes

rodas que andavam para trás, como nos filmes de

faroeste,

porque a tua solidão era algo que deveria ser só tua

e porque era fatal que

ninguém te compreendesse naquela aldeia provinciana,

nem mesmo teu marido,

o pobre e tedioso homem ferido pelo teu amor.

Bem, não me fales agora de tuas taquicardias

ou dos vestidos com anáguas e rendas;

deixa-me explicar-te

que só me sinto condoído

em razão de que te perseguiam furiosamente

os vizinhos ineptos no jogo

de teu coração virginal,

e o teu século era uma mudança

que se divisava tão lentamente através das gelosias

da herdade;

mas agora põe-te o anel ou os colares dos hippies

e pensa em Carnaby Street, em como alcançar a infidelidade

sem que tenhas que recorrer à tua consciência

de pobre senhorinha de província.

Julgo que estavas apenas procurando saber

como os outros haveriam de te despir,

e esses cretinos te traíram.

  Emma,

Dá-me a mão, não chores mais,

fica em silêncio

e escutemos juntos estes álbuns dos Beatles.

 

Referência:

 

VEIRAVÉ, Alfredo. Madame Bovary. In: BORDA, Juán Gustavo Cobo (Selleción, prólogo y notas). Antología de la poesía hispanoamericana. 1. ed. México, DF: Fondo de Cultura Económica, 1985. p. 365. (Colección ‘Tierra Firme’)

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