Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Gertrude Stein – A Autobiografia de Alice B. Toklas

Coligi algumas passagens da obra em epígrafe, obra que, apesar de ser intitulada como uma autobiografia, foi, de fato – tal qual se extrai de sua leitura – escrita por Gertrude Stein, autora norte-americana. A narrativa transcorre sob a visão de Alice B. Toklas, a também norte-americana e companheira da autora por 25 anos, circunstância que, dada a estreita relação entre as duas mulheres, convalida a presumível abordagem que Alice teria adotado em relação a Gertrude.

No fundo, Gertrude falando de si mesma. Afinal, a suposta “autobiografia” diz muito mais sobre a própria Gertrude; bem mais sobre a autora do que o seu pretenso tema.

Na obra, rolam páginas e páginas em que aparecem figuras importantes do período anterior, durante e após a 1GM – Matisse, Picasso, Hemingway, Cézanne, Ezra Pound, T. S. Eliot e muitos outros –, com fatos predominantemente ocorridos em Paris, numa época em que se dizia que a capital da França era “uma festa”. Uma suma social, artística e intelectual do período, portanto.

Trata-se de livro, estimo, que tende a não agradar a quem tem apreço pela forma de narração tradicional: há muita repetição, abundância de imagens, excessos idiossincrásicos nas teses ou modos de ver as coisas, tudo encapsulado num prodigioso fluxo de consciência.

Se afirmasse que o tipo de escrita que Stein empreende na referida autobiografia não está entre os de meu deleite, talvez a autora respondesse com a mesma ironia que permeia grande parte do seu texto, dizendo-me envolto em naftalina. Vejam esta asserção: “E o Hemingway é isto, parece moderno e cheira a museu” (STEIN, 2006, p. 225) (rs).

J.A.R. – H.C.

Gertrude Stein
(1874-1946)

“Depois de certo tempo cochichei a Picasso que gostava de seu retrato de Gertrude Stein. Sim, concordou, todo mundo diz que ela não é assim, mas não faz a menor diferença, vai terminar sendo, afirmou” (STEIN, 2006, p. 16).

Gertrude Stein
(Pintura de Pablo Picasso: 1905-1906)

“[...] Como Picasso já observou, quando se faz uma coisa, ela é tão complicada de fazer que termina ficando feia, mas os que a fazem depois não precisam mais se preocupar em fazê-la e podem deixá-la bonita, e assim todo mundo gosta quando são os outros que fazem” (STEIN, 2006, p. 27).

“Afirma que, se a gente quer se divertir, é melhor não ter a menor noção de como as coisas são feitas. Deve-se escolher uma ocupação absorvente e, para aproveitar ao máximo as outras coisas da vida, contemplar apenas os resultados. Desse modo, é inevitável sentir com mais intensidade do que os que entendem um pouco sobre como as coisas são feitas” (STEIN, 2006, p. 81).

“Ela sempre diz que não gosta do que é anormal por ser tão óbvio. E que o normal é simplesmente bem mais complicado e interessante do que parece” (p. 88).

“Os americanos, segundo Gertrude Stein, são que nem os espanhóis, abstratos e cruéis. Não que sejam brutais, mas cruéis. Ao contrário da maioria dos europeus, não mantêm contato íntimo com a terra. O materialismo deles não é o materialismo da existência, da posse, é o materialismo da ação e da abstração. E é por isso que o cubismo é espanhol” (STEIN, 2006, p. 96).

“[...] Todo mundo comenta a tristeza dos grandes artistas, a trágica infelicidade deles, mas eles, afinal de contas, são grandes artistas. Já o artista menor tem toda a trágica infelicidade e a tristeza dos grandes e, ainda por cima, não é grande” (p. 120).

“Faz umas seis semanas que Gertrude Stein disse: ‘está querendo me parecer que você nunca vai escrever a tal autobiografia. Sabe o que vou fazer? Vou escrevê-la para você. Vou escrevê-la com a mesma simplicidade com que Defoe escreveu a autobiografia de Robinson Crusoé. E ela escreveu, e é isto aqui” (STEIN, 2006, p. 262).

Alice B. Toklas
(1877-1967)

Referência:

STEIN, Gertrude. A autobiografia de Gertrude Stein. Tradução de Milton Persson. Porto Alegre: L&PM, 2006. (L&PM Pocket, n. 279)

Nenhum comentário:

Postar um comentário