Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Pier Paolo Pasolini – Fragmento à Morte

Poeta, novelista, cineasta, dramaturgo e ensaísta, o italiano Pier Paolo Pasolini era uma figura controvertida, mas de destaque na cultura italiana, até ser barbaramente assassinado em meados de nov/75, em Roma.

Lembro-me bem dos filmes de sua autoria a que assisti em salas de cineclubes ou comerciais em Belém (PA): O Evangelho Segundo São Mateus (1965), Teorema (1968), Decameron (1971), Contos de Canterbury (1972), 1001 Noites (1974) e por aí vai.

Àquela época, julgava as suas obras acentuadamente iconoclastas, como se quisesse, propositadamente, retirar a audiência da sua zona de conforto. E, em boa parte, ainda mantenho essa impressão. Mas as nossas impressões também mudam, e com o tempo reavaliamos os nossos pontos de vista.

Sem pretender fazer quaisquer conjecturas relacionadas às suas tendências sexuais invertidas, diria que, ainda assim, é quase impossível aferir o que ele representou para a cultura italiana contemporânea, e por extensão, mundial, sem alusões ao fato.

A sua obra poética, bem mais até que a cinematográfica, deixou-se permear pelas mediações que Pasolini lograva encetar com o seu próprio íntimo. Nela se percebe o recurso às odes, enquanto veículo catártico para os conflitos que o assolavam.

E para ilustrar o que dizemos, postamos a seguir um excerto de uma de suas poesias, “Frammento alla morte” (“Fragmento à morte”), por meio do qual se percebe o quanto Pasolini era um homem em luta consigo mesmo, carregado de ira, em equilíbrio instável ou em desequilíbrio, a ver em cada momento a possibilidade de transmutar-se em um novo ser por intermédio da morte, essa viagem que, como sabemos, não permite tutoria prévia.

Para os que desejam saber mais sobre o cineasta italiano, sugiro que assistam a este documentário, devidamente legendado em português, com o sugestivo nome “Pasolini e a Morte”.

J.A.R. – H.C. 
Pier Paolo Pasolini
(1922-1975)

Frammento alla morte
(Estratto)

Torno a te, come torna
un emigrato al suo paese e lo riscopre:
ho fatto fortuna (nell’intelletto)
e sono felice, proprio
com’ero un tempo, destituito di norma.
Una nera rabbia di poesia nel petto.
Una pazza vecchiaia di giovinetto.
Una volta la tua gioia era confusa
con il terrore, è vero, e ora
quasi con altra gioia,
livida, arida: la mia passione delusa.
Mi fai ora davvero paura,
perché mi sei davvero vicina, inclusa
nel mio stato di rabbia, di oscura
fame, di ansia quasi di nuova creatura.

De “La religione de mio tempo” (1961)

Prometeu Acorrentado
(Peter Paul Rubens: 1611-1612)

Fragmento à morte
(Excerto)

Regresso a ti, como regressa
um emigrado ao seu país e o redescobre:
fiz uma fortuna (no intelecto)
e sou feliz, tanto
quanto uma vez o fui, infenso a regras.
A negra fúria da poesia no peito.
Uma insana velhice de rapazinho.
Outrora tua alegria confundia-se
com o terror, é verdade, e agora
quase com outra alegria,
lívida, árida: a minha paixão desenganada.
Tornas-me agora deveras assustado,
porque realmente estás perto de mim, incorporada
ao meu estado de ira, de obscura
fome, de ânsia quase de nova criatura.

De “A religião de meu tempo” (1961)

Referência:

PASOLINI, Pier Paolo. Frammento alla morte (Estratto). In: La Botteghina del Libro, il segnalibro, n. 1, febbraio 2011, Forlì (IT). p. 2. Disponível neste endereço. Acesso em: 30 out 2014.

Nenhum comentário:

Postar um comentário