Prezados internautas, vejam o que encontrei numa seleta de poesias
russas, traduzidas ao galego, e referenciadas ao final desta postagem: o Demo,
com toda a sua retórica, “tenta seduzir Tamara [no poema ‘O Demônio’ (ou
‘Tamara’), de Lérmontov] e desviá-la do convento no qual está reclusa por
vontade própria, depois que o seu prometido, no caminho de volta do seu
casamento, foi assassinado por um bando de ossetos, habitantes do Cáucaso do
norte, de origem muçulmana, em permanente luta contra os russos e os
georgianos” (PUSHKIN et al., 2014, p. 29).
Óbvio está que, imediatamente, associei o aludido excerto do poema ao
“Fausto” de Goethe. Mas o texto de Lérmontov – que, aliás, faleceu no mesmo dia
do meu aniversário (27 de julho) – tem mais graça e nos faz imaginar a cena
patética que, eventualmente, se poderia produzir numa representação teatral do
que se passa.
J.A.R. – H.C.
Mikhaíl Lérmontov
(1814-1841)
Демон
Я тот, которому внимала
Ты в полуночной тишине,
Чья мысль душе твоей шептала,
Чью грусть ты смутно отгадала,
Чей образ видела во сне.
Я тот, чей взор надежду губит;
Я тот, кого никто не любит;
Я бич рабов моих земных,
Я царь познанья и свободы,
Я враг небес, я зло природы,
И, видишь, я у ног твоих!
Тебе принес я в умиленье
Молитву тихую любви,
Земное первое мученье
И слезы первые мои.
О! выслушай, из сожаленья!
Меня добру и небесам
Ты возвратить могла бы словом.
Твоей любви святым покровом
Одетый, я предстал бы там
Как новый ангел в блеске новом.
О! только выслушай, молю,
Я раб твой, я тебя люблю!
Лишь только я тебя увидел,
И тайно вдруг возненавидел
Бессмертие и власть мою.
Я позавидовал невольно
Не полной радости земной;
Не жить как ты мне стало больно,
И страшно – розно жить с тобой.
В бескровном сердце луч нежданый
Опять затеплился живей,
И грусть на дне старинной раны
Зашевелилася как змей.
Что, без тебя, мне эта вечность?
Моих владений бесконечность?
Пустые звучные слова,
Обширный храм – без божества!
Read by Vlad
Kazimirov
O Demônio
Eu sou aquele que escutavas
No silêncio da meia
noite,
Cujo pensamento
sussurrava à tua alma,
De quem a tristeza
vagamente percebias,
Cuja imagem povoava
os teus sonhos.
Eu sou o olhar que
aniquila a esperança;
Eu sou aquele de quem
ninguém gosta;
Sou o chicote de meus
servos na terra,
Sou o príncipe do
saber e da liberdade,
Sou o inimigo dos céus,
a desgraça da natureza,
E, olha, estou aos
teus pés!
A ti ofereço com
ternura
Esta silenciosa
oração de amor,
O meu primeiro
tormento terrenal
E as minhas primeiras
lágrimas.
Oh! Escuta, por
piedade!
Ao bem e aos céus
poderias
Devolver-me com tuas
palavras.
Coberta pelo sagrado
manto de teu amor,
Lá eu me
apresentaria,
Como um anjo novo com
um novo esplendor.
Oh! Somente escuta,
suplico-te,
Sou o teu servo, eu
te amo!
Assim que te vi,
Repentinamente
comecei a odiar em segredo
A imortalidade e o
meu poder.
Passei a muito
invejar a meu pesar
As nunca plenas
alegrias mundanas;
Não viver como tu
deixa-me combalido,
E terrível seria
viver separado de ti.
Em meu coração sem
sangue um súbito raio
Fê-lo novamente
pulsar,
E a tristeza no fundo
de uma velha ferida
Começou a mover-se
como uma serpente.
O que é, para mim,
essa eternidade sem ti?
Minhas posses
infinitas?
Vazias e estentóreas
palavras,
Um templo amplo – sem
uma deidade!
Referência:
LÉRMONTOV, Mikhaíl. O demo II, 10; Демон II, 10. In: PUSHKIN, Alexandr et. al. Antoloxía de poesía rusa: de Pushkin a
Evtushenko. Tradución de Lourenzo Maroño e Elena Sherevera. ATG – Asociación de
Tradutores Galegos. p. 29. Disponível em: <http://tradutoresgalegos.com/pdf/antoloxia_rusa_.pdf>.
Acesso em: 29 set. 2014.
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