Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Dom Quixote (V): “Litanias” por Rubén Darío

Retornando ao tema das aventuras do amado Dom Quixote e de seu idealismo tresloucado, trazemos neste ‘post’ um belo poema de autoria do poeta e diplomata nicaraguense Rubén Darío – neste blog já presente em outro poema. Trata-se do clássico “Litania de Nosso Senhor Dom Quixote”, a evocar pelo seu título, de algum modo, as “Litanias de Satã”, de Charles Baudelaire.

Afixamos, também, no interstício entre o original, em espanhol, e a versão que produzimos, em português, uma interessante pintura do espanhol Eduardo Pisano, passível de ser associada, de modo similar, às representações iconográficas religiosas de São Jorge.

J.A.R. – H.C. 
Rubén Darío
(1867-1916)

Letanía de Nuestro Señor Don Quijote

(A Francisco Navarro Ledesma)

Rey de los hidalgos, señor de los tristes,
que de fuerza alientas y de ensueños vistes,
coronado de áureo yelmo de ilusión;
que nadie ha podido vencer todavía,
por la adarga al brazo, toda fantasía,
y la lanza en ristre, toda corazón.

Noble peregrino de los peregrinos,
que santificaste todos los caminos
con el paso augusto de tu heroicidad,
contra las certezas, contra las conciencias
y contra las leyes y contra las ciencias,
contra la mentira, contra la verdad...

¡Caballero errante de los caballeros,
varón de varones, príncipe de fieros,
par entre los pares, maestro, salud!
¡Salud, porque juzgo que hoy muy poca tienes,
entre los aplausos o entre los desdenes,
y entre las coronas y los parabienes
y las tonterías de la multitud!

¡Tú, para quien pocas fueron las victorias
antiguas y para quien clásicas glorias
serían apenas de ley y razón,
soportas elogios, memorias, discursos,
resistes certámenes, tarjetas, concursos,
y, teniendo a Orfeo, tienes a orfeón!

Escucha, divino Rolando del sueño,
a un enamorado de tu Clavileño,
y cuyo Pegaso relincha hacia tí;
escucha los versos de estas letanías,
hechas con las cosas de todos los días
y con otras que en lo misterioso vi.
     
¡Ruega por nosotros, hambrientos de vida,
con el alma a tientas, con la fe perdida,
llenos de congojas y faltos de sol,
por advenedizas almas de manga ancha,
que ridiculizan el ser de la Mancha,
el ser generoso y el ser español!

¡Ruega por nosotros que necesitamos
las mágicas rosas, los sublimes ramos
de laurel! Pro nobis ora, gran señor.
(Tiembla la floresta de laurel del mundo,
y antes que tu hermano vago, Segismundo,
el pálido Hamlet te ofrece una flor).

Ruega generoso, piadoso, orgulloso,
ruega casto, puro, celeste, animoso;
por nos intercede, suplica por nos,
pues casi ya estamos sin savia, sin brote,
sin alma, sin vida, sin luz, sin Quijote,
sin pies y sin alas, sin Sancho y sin Dios.

De tantas tristezas, de dolores tantos,
de los superhombres de Nietzsche, de cantos
áfonos, recetas que firma un doctor,
de las epidemias, de horribles blasfemias
de las Academias
¡líbranos, señor.

De rudos malsines,
falsos paladines
y espíritus finos y blandos y ruines,
del hampa que sacia
su canallocracia
con burlar la gloria, la vida, el honor,
del puñal con gracia,
¡líbranos, señor!

Noble peregrino de los peregrinos,
que santificaste todos los caminos
con el paso augusto de tu heroicidad,
contra las certezas, contra las conciencias
y contra las leyes y contra las ciencias,
contra la mentira, contra la verdad...

      Ora por nosotros, señor de los tristes,
que de fuerza alientas y de ensueños vistes,
coronado de áureo yelmo de ilusión;
¡que nadie ha podido vencer todavía,
por la adarga al brazo, toda fantasía,
y la lanza en ristre, toda corazón!

(Madrid, abril de 1905)
[Cantos de Vida y Esperanza]

Don Quijote Victorioso
Eduardo Pisano: 1912-1986
Pintor Espanhol

Litania de Nosso Senhor Dom Quixote

(A Francisco Navarro Ledesma)

      Rei dos fidalgos, senhor dos tristes,
que de força sustentas e de quimeras vestes,
coroado de áureo elmo de ilusão;
que ninguém logrou ainda vencer,
pelo escudo ao braço, todo fantasia,
e pela lança em riste, toda coração.

     Nobre peregrino dos peregrinos,
que santificaste todos os caminhos
com o passo augusto de tua heroicidade,
contra as certezas, contra as consciências
e contra as leis e contra as ciências,
contra a mentira, contra a verdade...

Cavaleiro errante dos cavaleiros
varão de varões, príncipe de indômitos,
par entre os pares, mestre, saúde!
Saúde, porque julgo que hoje muito pouca tens,
entre os aplausos ou entre os desdéns,
e entre as coroas e os parabéns
e as parvoíces da multidão!

Tu, para quem poucas foram as vitórias
antigas e para quem clássicas glórias
seriam apenas de lei e razão,
suportas elogios, memórias, discursos,
resistes certames, cartões, concursos,
e, tendo Orfeu, tens orfeão!

Escuta, divino Rolando do sonho,
um namorado de teu Clavilenho,      
e cujo Pégaso relincha até junto a ti;
escuta os versos destas litanias,
feitas com as coisas de todos os dias
e com outras que no misterioso vi.

Roga por nós, famintos de vida,
com a alma às cegas, com a fé perdida,
cheios de angústias e carentes de sol,
por adventícias almas indulgentes à farta,
que ridicularizam o ser da Mancha,
o ser generoso e o ser espanhol!

Roga por nós que necessitamos
das mágicas rosas, dos sublimes ramos
de laurel! Pro nobis ora, grão senhor.
(Agita a floresta de laurel do mundo,
e antes que o teu ocioso irmão, Segismundo,
o pálido Hamlet te oferece uma flor).

Roga generoso, piedoso, orgulhoso,
roga casto, puro, celeste, animoso;
por nós intercede, suplica por nós,
pois quase já estamos sem seiva, sem broto,
sem alma, sem vida, sem luz, sem Quixote,
sem pés e sem asas, sem Sancho e sem Deus.

De tantas tristezas, de dores tantas,
dos super-homens de Nietzsche, de cantos
afônicos, receitas que prescreve um doutor,
das epidemias, de horríveis blasfêmias
das Academias
livra-nos, senhor.

De rudes delações,
falsos paladinos
e espíritos finos e brandos e ruins      
da malta que satisfaz
sua canalhocracia
burlando a glória, a vida, a honra,
do punhal com graça,
livra-nos, senhor!

Nobre peregrino dos peregrinos,
que santificaste todos os caminhos
com o passo augusto de tua heroicidade,
contra as certezas, contra as consciências
e contra as leis e contra as ciências,
contra a mentira, contra a verdade...

Ora por nós, senhor dos tristes,
que de força sustentas e de quimeras vestes,
coroado de áureo elmo de ilusão;
que ninguém logrou ainda vencer,
pelo escudo ao braço, todo fantasia,
e pela lança em riste, toda coração!

(Madrid, abril de 1905)
[Cantos de Vida e de Esperança]

Recitação do Poema
(José Varela)

Referência:

DARÍO, Rubén. Letanía de nuestro señor Don Quijote. In: __________. Cuarenta y cinco poemas. Prólogo de Ludovico Silva. Selección de Oscar Rodríguez Ortiz. Caracas (VE): Fundación Biblioteca Ayacucho, 1994. p. 77-79. (Colleción “Claves de América”)

Nenhum comentário:

Postar um comentário