Ernesto Sabato, autor argentino, físico de formação, escreve seus
pensamentos mais caros com uma sensibilidade incrível, capaz de capturar recônditos
interesses dos leitores por meio de sua ampla sabedoria, acumulada em quase uma
centúria de sua profícua vida.
No excerto que roubamos à sua obra “A Resistência”, o escritor deplora
os efeitos que a televisão tem impingido sobre o nível de convivência das
pessoas, o conhecimento mais substancioso das coisas, o apuro intelectual que
somente os grandes livros são capazes de transmitir às gerações futuras e por
aí vai.
Ao lê-lo, ri-me graciosamente dos seus efeitos, porque costumo dizer à
minha arrumadeira que, se num dado momento, me for furtada a televisão – e
espero que seja exatamente um furto, e não um roubo, com a violência ou a grave
ameaça que este pressupõe (rs) –, a pessoa que mais sentirá o impacto de sua
ausência não serei eu, mas ela mesma, porque passa a manhã e parte da tarde dos
sábados com o equipamento ligado. E para adquirir outra, certamente duraria um
bocado, pois estou por demais acostumado com o meu Monitor-TV, por meio do qual
tudo faço, desde assistir a filmes até acessar a internet ou redigir documentos.
E tudo isso como consequência de que nada supera o amor que tenho pelos livros
(físicos, diga-se!). Desse modo, venho testando há algumas décadas a
estabilidade das estruturas do prédio onde resido (rs), pois são muitos os exemplares: nas
estantes da sala, nos armários dos quartos, nos gaveteiros inferiores da cama...
Gosto de sublinhá-los com lápis, de escrever algumas referências nas
bordas, virar as suas páginas para frente e para trás com a maior liberdade e,
também, com o maior cuidado possível, pois a paixão que tenho pelas obras de
valor vai até o extremo de manter a sua integridade e beleza ao longo do tempo.
Ainda sou resistente a usar mais intensamente o ‘kindle’ que ganhei de
presente dos colegas de trabalho há algumas semanas, pela passagem do meu
aniversário. Mas aos poucos, tudo vem se ajustando à nova tecnologia.
Para encerrar, vou parodiar o bordão de um amigo, que costuma repeti-lo
aos quatro ventos, de modo reiterado, a cada vez que ocorrem fatos insólitos ou
imprevisíveis: “Morro e não vejo tudo”. No meu caso: “Morro e não leio tudo!”
(rs).
J.A.R. – H.C.
Ernesto Sabato
(1911-2011)
“É urgente reconhecermos os espaços de
encontro que podem nos salvar de ser uma multidão massificada assistindo
isoladamente à televisão. O paradoxal é que essa tela nos dá a sensação de
estarmos ligados ao mundo inteiro, quando na verdade ela nos rouba a
possibilidade de convivermos de forma humana e, o que é igualmente grave, nos
predispõe à abulia. Tenho dito em muitas entrevistas, em tom de ironia, que “a
televisão é o ópio do povo”, alterando a famosa frase de Marx. Mas de fato acho
que estamos ficando entorpecidos diante da tela, e mesmo quando não encontramos
nada do que procuramos, continuamos lá, incapazes de nos levantar e ir fazer
algo de bom. Ela nos tira a vontade de trabalhar em algum artesanato, de ler um
livro, de fazer um conserto na casa enquanto se escuta música ou se toma um
mate. Ou de ir ao bar com um amigo, bater um papo com alguém da família. É um
tédio, um fastio a que nos acostumamos “por falta de coisa melhor”. Ficar
monotonamente sentado diante da televisão anestesia a sensibilidade, torna a
mente lerda, prejudica a alma” (SABATO, 2008, p. 14-15).
Referência:
SABATO, Ernesto. A resistência. Tradução de Sérgio Molina. Primeira Reimpressão. São
Paulo: Companhia das Letras, 2008.
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