O matemático, filósofo e – por que não dizer? – místico francês Blaise
Pascal é autor de alguns pensamentos que marcaram a história da cultura
ocidental: quem jamais ouviu falar na expressão “O coração tem suas razões, que
a razão não conhece.” (PASCAL, 2005, p. 110; n. 277), ou mesmo “Divertida
justiça que um rio limita! Verdade aquém dos Pirineus, erro além.” (PASCAL,
2005, p. 110; n. 294)?!
Por aí já se percebe toda a complexidade do raciocínio de Pascal, que, nada obstante, condena a racionalidade imoderada na experiência humana. Diz-nos
ele: “Dois excessos: excluir a razão; só admitir a razão” (PASCAL, 2005, p.
100; n. 253).
Não se estranhe, por conseguinte, que haja passagens em sua obra máxima –
“Pensamentos” – impregnadas de pessimismo e de invocação deísta, quando, por
exemplo, vem a tratar da questão da verdade, como neste excerto: “Não é este o
país da verdade: esta erra, desconhecida, entre os homens. Deus a envolveu com
um véu que a mantém desconhecida dos que não lhe ouvem a voz” (PASCAL, 2005, p.
276; n. 843).
Mas o nosso interesse com esta postagem é trazer o brilho de algumas reflexões
selecionados de Pascal, sobre temas variados como a verdade, a mentira, a
argumentação, a persuasão e a beleza poética – e lá vem, de novo, a alegoria
feminina justaposta nos contrafortes do raciocínio por ele lavrado! (rs).
J.A.R. – H.C.
Blaise Pascal
(1623-1662)
9. Para
que se possa repreender de maneira útil e que se mostre a alguém o seu erro, é
preciso observar de que ponto de vista se enxerga o assunto, porque, em geral,
é verdadeiro para aquele que observa, e então reconhecer-lhe a verdade, mas
desvendar-lhe o lado falso. Dessa maneira, contentamos à pessoa enganada, pois
ela percebe que não estava equivocada e sim que deixara apenas de encarar as
coisas de todos os ângulos possíveis; ninguém se aborrece por não ter visto
tudo, mas ninguém deseja equivocar-se; e talvez isso derive do fato de o homem
ser incapaz de ver tudo e de, naturalmente, não poder se enganar no ângulo
escolhido; e isso porque as percepções dos sentidos são sempre verdadeiras
(PASCAL, 2005, p. 32).
10. O
homem em geral se convence mais com os argumentos que ele mesmo tece do que com
aqueles que surgem no espírito alheio (PASCAL, 2005, p. 32).
33. Beleza
poética: Assim como dizemos beleza poética, deveríamos dizer beleza geométrica
e beleza médica; não o dizemos, porém; e o motivo é que conhecemos bem o objeto
da geometria, o qual consiste em provar, e o objeto da medicina, que é curar;
mas não sabemos em que consiste o prazer, objeto da poesia. Desconhecemos esse
modelo natural que é preciso imitar; e, na ausência desse conhecimento, criamos
estranhos termos: séculos de ouro, maravilha de nossos dias, fatal etc., e a
esse jargão denominamos beleza poética.
Quem imaginar, porém, uma mulher conforme o
modelo que consiste em falar ninharias com palavras belas irá deparar com uma
bela senhorita com muitas pulseiras e de quem zombará, pois sabemos melhor a
respeito do encanto de uma mulher do que do prazer de um verso. Aqueles que não
o soubessem, no entanto, admirá-la-iam com esses adornos; e em muitas aldeias
tomá-la-iam por rainha. Por isso chamamos aos sonetos assim feitos as rainhas
da aldeia (PASCAL, 2005, p. 37).
739. A
verdade está tão ofuscada nestes tempos, e a mentira tão assentada que, a menos
que amemos a verdade, não saberíamos reconhecê-la (PASCAL, 2012, p. 582-583).
740. Os (astutos) são
pessoas que conhecem a verdade, porém somente a defendem quanto convém a seus
interesses, fora dos quais a abandonam (PASCAL, 2012, p. 583).
PASCAL, Blaise. Pensamentos. Consultoria de Marilena de Souza Chauí. Tradução de
Olívia Bauduh. São Paulo: Nova Cultural, 2005. (Os Pensadores)
PASCAL, Blaise. Pensamientos y otras obras. Estudio introductorio por Alicia Villar
Ezcurra. Traducción de Carlos R. de Dampierre. Madrid (ES):
Gredos, 2012. (Grandes Pensadores)
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