Alpes Literários
Subtítulo
domingo, 31 de agosto de 2014
Calvin & Haroldo - Pesquisas Eleitorais para o Cargo de Pai
sábado, 30 de agosto de 2014
ISTOÉ: “Os Políticos Não Falam a Língua dos Jovens”
A
revista ISTOÉ desta semana apresenta uma interessante reportagem sobre pesquisa
que realizou com jovens entre 16 e 33 anos, os quais se estima que correspondam
a 1/3 do eleitorado brasileiro.
A
matéria completa, disponível neste endereço,
tem por chamada as seguintes sentenças: (i) 63% acham que o Brasil não
está no rumo certo; (ii) 59% acreditam que a
situação estaria melhor se não existissem partidos; e
(iii) mais de 50% deles encontram-se entre os eleitores indecisos ou que
pretendem anular o voto.
Outro
ponto digno de nota é o parecer do cientista político Ricardo Guedes,
para quem só metade do eleitorado do país definiu seu candidato, “e
a diferença do voto certo entre Marina e Aécio é de menos que 4%”. Com o voto
racional tendendo cada vez mais a prevalecer sobre o voto de comoção e de
protesto, Guedes acredita que o eleitor focará os programas eleitorais e os
debates. “O currículo e as propostas são elementos de decisão”, acentua (ISTOÉ,
3 set 2014, p. 30).
Ao
longo da reportagem, consta a entrevista com o presidente do Instituto Data
Popular, Renato Meirelles, segundo o qual os jovens na precitada
faixa etária serão decisivos na eleição de outubro, pois, além de votarem,
ainda formam opinião em casa.
Os
negritados em vermelho são de nossa autoria, para alertar o internauta para
pontos que, não sendo óbvios, oferecem contornos a merecer atenção por parte
dos representantes políticos brasileiros, se quiserem se manter antenados com
as mudanças que os tempos modernos demandam.
Descontem-se,
obviamente, os claros elementos de “doxa” no discurso do entrevistado.
J.A.R.
– H.C.
“Os políticos não falam a língua dos jovens”
ISTOÉ
– Muitos analistas apostam que essas serão as eleições da mudança. O sr.
concorda com isso?
Renato
Meirelles – As pesquisas mostram que as pessoas querem um Brasil
diferente do que está hoje, mas com uma garantia
efetiva de que as conquistas dos últimos anos não sejam perdidas. O eleitor
está insatisfeito com a situação do País da porta de casa para fora, já que do
lado de dentro as pessoas sabem que as coisas melhoraram muito. Essa
será uma eleição de futuro e não de passado.
ISTOÉ
– Isso explica, por exemplo, o fato de os candidatos defenderem os programas
sociais do governo e concentrarem as críticas em economia e gestão pública?
Meirelles
– Economistas não entendem de gente de carne e osso. De nada vale
discutir o passado. Só um terço dos eleitores tem condições maduras de comparar
os governos FHC e Lula. O eleitor não quer mais
discutir cesta básica, ele quer banda larga. Ele não quer dentadura, mas o
Bolsa Família 2.0.
ISTOÉ
–O que é Bolsa Família 2.0?
Meirelles
– Essa juventude quer maior conectividade, acessos livres a
banda larga e a tecnologia de ponta. Eles representam 33% do eleitorado e 85%
deles são internautas.
ISTOÉ
– Mas problemas econômicos, como a alta da inflação e a falta de crescimento do
PIB, não pautam o voto?
Meirelles
– A maior parte dos eleitores é da classe C e eles não entram e
nem querem saber sobre essa conversa de pibinho, taxa Selic e tripé macroeconômico. Eles
querem saber sobre o preço do tomate, do emprego e da diminuição dos juros no
crediário e nos juros do cheque especial.
ISTOÉ
– Quais são os desejos e necessidades desses eleitores?
Meirelles
– Eles querem saber quem vai garantir a creche para as
mulheres que foram para o mercado de trabalho. Querem
serviços públicos de mais qualidade e não abrem mão da manutenção do poder de
compra.
ISTOÉ
– Quem são os jovens dessa geração digital?
Meirelles
– São jovens de 18 a 33 anos, uma mistura das gerações Y e X
(nascidos entre 1980 e hoje) e predominantemente de classe C. Gastam R$ 200
bilhões por ano. De cada R$ 100 que um pai da classe alta injeta na economia do
lar, o filho jovem coloca R$ 57. Na classe C, o filho coloca R$ 96. É por isso
que os filhos influenciam mais a economia doméstica. Além disso, eles
são mais escolarizados que os pais e mais conectados.
ISTOÉ
– Qual será a importância deles nas eleições de outubro?
Meirelles
– Como os jovens decidem mais sobre as coisas dentro de casa,
eles são os novos formadores de opinião. Isso vale tanto para a compra de um
produto quanto para a decisão do voto familiar. Não há como discutir o processo
eleitoral sem falar da juventude. Os jovens olham para a
frente; são eles que vão ajudar a decidir as eleições este ano.
ISTOÉ
– As pesquisas mostram em qual candidatura eles estão apostando as fichas?
Meirelles
– É muito cedo para falar em definições, mas
certamente a entrada da candidata Marina Silva modificou o quadro eleitoral. A
ex-senadora, ao que tudo indica, consegue angariar o voto jovem, que soma boa
parte dos descontentes com a política que saíram às ruas em junho do ano
passado.
ISTOÉ
– O que as manifestações de junho de 2013 deixaram de legado?
Meirelles
– Que os jovens não aceitam mais uma classe política que não
os representa. Eles querem ser protagonistas da própria história. Essa geração
não aceita hierarquias, censura e tampouco tentativas de silenciá-los.
ISTOÉ
– Os jovens estão mais insatisfeitos?
Meirelles
– Por serem mais escolarizados e conectados que os pais, eles
são mais críticos com a real situação do País. Eles
não enxergam na classe política a solução para um futuro melhor.
ISTOÉ
– Isso explica por que a maioria dos jovens está indecisa ou pretende anular o
voto?
Meirelles
– Os políticos não sabem levar a pauta política para o
cotidiano dos jovens. Eles não falam a linguagem desse eleitorado. Os políticos
são analógicos e os jovens são digitais. Eles têm uma
mentalidade velha que avalia políticas públicas pela lógica da oferta e não
pela demanda. Ou seja, é mais importante o que os estudiosos afirmam que é bom
para as pessoas, do que o que o povo sabe que é importante para elas.
Referência:
ISTOÉ. O
que os jovens pensam sobre a política. Ano 38, n. 2336 (3 set 2014). p.
50-55. Acesso em: 30 ago 2014. Disponível neste endereço.
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quinta-feira, 28 de agosto de 2014
Santayana – Giros de Pensamento
quarta-feira, 27 de agosto de 2014
Roberto Juarroz – 11ª Poesía Vertical (I) [1988]
Trazemos nesta postagem um belo poema do escritor,
bibliotecário e ensaísta argentino Roberto Juarroz. Por meio dele se percebe o
quanto o ato de escrever é invasivo para o autor em foco: a escrita equivale à
totalidade do seu ser.
Assim para muitos, a expressão poética talvez sirva
como um processo catártico, com potencial para dar vazão ao conteúdo latente de
sentimentos enclausurados: uma escrita fluida e ininterrupta, como a própria
vida.
Ou por outra, a plena equivalência entre um fato da
vida e a sua redução à palavra escrita – ou, mais amplamente, a um livro, como
postulava Mallarmé (1945, p. 378): “Tout, au monde, existe pour aboutir à un
livre” (“Tudo, no mundo, existe para terminar num livro”).
J.A.R. – H.C.
Roberto Juarroz
(1925-1995)
Undécima Poesía Vertical
(I)
El poema continuo,
la escritura
continua,
el texto que nunca se
termina
y nunca se
interrumpe,
el texto equivalente
a ser.
La vida se convierte
en una forma de
escritura
y cada cosa es una letra,
un signo de
puntuación,
la inflexión de una
frase.
Inaugural metabolismo
de una filología
que ha descubierto un
nuevo verbo:
el verbo siempre.
La poesía se escribe
siempre,
vivir se vive
siempre,
algo despierta
siempre:
poema-siempre.
El ser es escritura.
Y una palabra es
suficiente
para toda la acción:
siempre.
El otro verbo,
nunca,
es tan sólo su
sombra.
A pintura é poesia
(Nay Sun: artista de
Mianmar)
Décima Primeira Poesia Vertical
(I)
O poema contínuo,
a escrita contínua,
o texto que nunca se
termina
e nunca se
interrompe,
o texto equivalente a
ser.
A vida se converte
em uma forma de
escrita
e cada coisa é uma
letra,
um sinal de
pontuação,
a inflexão de uma
frase.
Inaugural metabolismo
de uma filologia
que tem descoberto um
novo verbo:
o verbo sempre.
A poesia se escreve
sempre,
viver se vive sempre,
algo desperta sempre:
poema-sempre.
O ser é escrita.
E uma palavra é
suficiente
para toda a ação:
sempre.
O outro verbo,
nunca,
é tão somente sua
sombra.
Referências:
JUARROZ, Roberto. Décima
Primeira Poesia Vertical. In: __________. Poesía
vertical: antología essencial. Selleción de Sandra Santana Mora y Beatriz
San Vicente. Supervisión por Laura Cerrato. 1. ed. Buenos Aires: Emecé, 2001.
p. 32.
MALLARMÉ, Stéphane. Le livre, instrument spirituel.
In: ________. Oeuvres completes.
Texte établi et annoté par Henri Mondor et G. Jean-Auvry. Paris (FR):
Gallimard, 1945. p. 378-382.
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terça-feira, 26 de agosto de 2014
T. S. Eliot - O Poeta e a Poesia
Eliot, o grande poeta e crítico literário
inglês, muito refletiu sobre a sua arte, deixando-nos um conjunto de ensaios
que, ainda hoje, repercute nos meios acadêmicos. Num deles, “Tradition and the
Individual Talent”, de 1919, declina os seus pontos de vista sobre o que seria
o respeito à tradição, sem entrega a um mero processo de repetição “ad
infinitum”, senão pelo contraste ao que, segundo o autor, conforma os
“monumentos existentes”.
Notemos que Eliot alude a tais monumentos
existentes dentro de uma “ordem ideal”, ordem que somente se romperia pelo
surgimento de uma obra realmente nova. E sabe você, internauta, o que esse
argumento fez-me lembrar? Do conceito de “paradigma”, cunhado pelo físico
norte-americano Thomas Kuhn (1922-1996), para designar um referente capaz de
romper o estado da arte na pesquisa de um determinado campo do saber.
Assim, se a homologia for mesmo válida – pois
tenho suspeitas quanto a isso! –, uma obra de arte, ou mesmo um movimento
literário paradigmático, não se compagina com os seus precedentes, embora não
os ignore, mas se erige em contraposição a estes. Talvez possa não constituir
algo “ab ovo”, mas certamente representa novas linhagens conceituais que
apontam para um futuro, sem replicar modorrentamente os cânones do passado.
O “Modernismo” seria um caso?! Os representantes
da “Semana de Arte Moderna” (11 a 18 de fevereiro de 1922), por conhecerem
muito bem o passado daquilo que constituía a então chamada “Literatura
Brasileira”, sabiam muito bem o que não queriam, embora o que, de fato,
propugnavam se arrogasse muito mais como uma causa do incógnito.
Em outra passagem do mesmo ensaio, Eliot parece
falar com os críticos que apreciam a abordagem biográfica do artista da
palavra, imbricada com elementos extraliterários, conquanto, a seu ver, carente
de melhores perspectivas capazes de dar conta do fenômeno artístico em sua
plenitude.
Como defendo o credo de que o leitor atento é
suficientemente capaz de interpretar um texto, bem à sua maneira, de forma a
captar o sentido que o escritor-interlocutor diligencia em lhe transmitir,
passo à transcrição das passagens que considero eloquentes no precitado ensaio
de Eliot.
Mesmo assim, internauta, não deixe de cismar
deste que vos fala: estou lhe posicionando em frente a duas telas entre as
muitas no corredor de um museu. Você poderia me perguntar: por que não outras
duas telas, noutra ala desse mesmo ou de outro museu?! Então lhe responderia:
“visita direcionada” é isso mesmo! Você aceita ou não o caminho por onde lhe
levam. Perceba-se que não há neutralidade nas perspectivas selecionadas! (rs).
J.A.R. – H.C.
Thomas Stearns Eliot
(1888-1965)
Nenhum poeta, nenhum artista, tem sua significação
completa sozinho. Seu significado e a apreciação que dele fazemos constituem a
apreciação de sua relação com os poetas e artistas mortos. Não se pode
estimá-lo em si; é preciso situá-lo, para contraste e comparação, entre os
mortos. Entendo isso como um princípio de estética, não apenas histórica, mas
no sentido crítico. É necessário que ele seja harmônico, coeso, e não
unilateral; o que ocorre quando uma nova obra de arte aparece é, às vezes, o
que ocorre simultaneamente com relação a todas as obras de arte que a precedem.
Os monumentos existentes formam uma ordem ideal entre si, e esta só se modifica
pelo aparecimento de uma nova (realmente nova) obra entre eles (ELIOT, 1989, p.
39).
Desviar o interesse do poeta para a poesia é um
objetivo louvável, pois isso levaria em verdade a uma avaliação mais justa da
poesia atual, quer seja boa, quer seja má. Há muitas pessoas que apreciam a
expressão de uma emoção sincera em verso, e há um grupo mais seleto de pessoas
que podem apreciar a excelência técnica. Mas muito poucos sabem quando ocorre
uma expressão de significativa emoção, emoção que tem sua vida
no poema, e não na história do poeta. A emoção da arte é impessoal. E o poeta
não pode alcançar essa impessoalidade sem entregar-se ele próprio inteiramente
à obra que será concebida. E não é provável que ele saiba o que será concebido,
a menos que viva naquilo que não é apenas o presente, mas o momento presente do
passado, a menos que esteja consciente, não do que está morto, mas do que agora
continua a viver (ELIOT, 1989, p. 48).
Referência:
ELIOT, T. S. Tradição e talento individual. In:
__________. Ensaios. Tradução, introdução e notas de Ivan
Junqueira. São Paulo: Art Editora, 1989. p. 37-48.