Tagore nos faz ver o
quão transitórios são os presentes materiais que concedemos aos nossos pares,
quer sejam joias, quer flores, quer ainda canções, deixando eles muitas vezes
de capturar o real sentido de nossos sentimentos pelas pessoas a quem os outorgamos:
pelo que se depreende da linha de argumentação do poema, melhores são as
experiências que nos enchem de assombro e nos conectam com a beleza do mundo à
nossa volta, conquanto efêmeras por igual, mas que se nos fixam em inolvidáveis
memórias.
Sublinha-se, assim, o
encanto dos momentos fugazes, perpassados pelo inesperado e pela surpresa que
se dissemina pelos estágios da vida – o perfume de uma incógnita flor ou um
raio de sol entre as frondes no ocaso –, reconhecendo-se a impossibilidade de capturar-lhes
a essência, ou bem pelas mãos ou bem por meio de palavras.
J.A.R. – H.C.
Rabindranath Tagore
(1861-1941)
Gift
O my love, what gift
of mine
Shall I give you this
dawn?
A morning song?
But morning does not
last long –
The heat of the sun
Wilts it like a
flower
And songs that tire
Are done.
O friend, when you
come to my gate
At dusk
What is it you ask?
What shall I bring
you?
A light?
A lamp from a secret
corner of my silent house?
But will you want to
take it with you
Down the crowded
street?
Alas,
The wind will blow it
out.
Whatever gifts are in
my power to give you,
Be they flowers,
Be they gems for your
neck,
How can they please
you
If in time they must
surely wither,
Crack,
Lose lustre?
All that my hands can
place in yours
Will slip through
your fingers
And fall forgotten to
the dust
To turn into dust.
Rather,
When you have
leisure,
Wander idly through
my garden in spring
And let an unknown, hidden
flower’s scent startle you
Into sudden wondering
–
Let that displaced
moment
Be my gift.
Or if, as you peer
your way down a shady avenue,
Suddenly, spilled
From the thick
gathered tresses of evening
A single shivering
fleck of sunset-light stops you,
Turns your daydreams
to gold,
Let that light be an
innocent
Gift.
Truest treasure is
fleeting;
It sparkles for a
moment, then goes.
It does not tell its
name; its tune
Stops us in our
tracks, its dance disappears
At the toss of an
anklet.
I know no way to it –
No hand, nor word can
reach it.
Friend, whatever you
take of it,
On your own,
Without asking,
without knowing, let that
Be yours.
Anything I can give
you is trifling –
Be it a flower, or a
song.
Presente
(Ernest L.
Blumenschein: pintor norte-americano)
Presente
Ó meu querido, que
presente meu
Devo te dar neste
alvorecer?
Uma canção matinal?
Mas a manhã não dura muito –
O calor do sol
Murcha-a como uma
flor,
E mesmo as mais
insistentes canções
Esgotam-se por fim.
Ó amigo, quando te
acercas do meu portão
Ao anoitecer,
O que é que hás de
pedir?
O que é que eu hei de
te oferecer?
Uma luz?
Uma lâmpada de um
canto secreto de minha
silenciosa morada?
Mas quererás levá-la
contigo
Pela rua cheia de
gente?
Infelizmente,
O vento a apagará.
Quaisquer que sejam
os presentes que eu possa
te obsequiar,
Sejam flores,
Sejam pedras
preciosas para adornares o pescoço,
Como poderão te agradar
Se, com o tempo,
certamente definharão,
Quebrarão,
Perderão o brilho?
Tudo o que as minhas
mãos puderem colocar nas tuas,
Escapará por entre os
teus dedos
E cairá esquecido no
pó,
Para nele se transmutar.
Em vez disso,
Quando dispuseres de
tempo livre,
Vagueia ociosamente
na primavera pelo meu jardim
E deixa que o perfume
de uma oculta e desconhecida
flor te seduza
Num assombro
repentino –
Permite que esse esporádico
momento
Seja o meu presente.
Ou se, enquanto
perscrutas uma alameda sombreada,
Subitamente, vertido
Por entre os densos cúmulos
entrançados do anoitecer,
Um único e trêmulo
raio de luz crepuscular te imobilizar,
Convertendo teus mais
acalentados sonhos em ouro,
Que essa luz seja um
inocente
Presente.
Fugaz é o mais
genuíno tesouro;
Brilha por um momento
e logo esmaece.
Não diz o seu nome;
sua melodia
Nos detém em nossas trilhas,
sua dança se esvai
Ao sonoro menear de
guizos nos artelhos.
Não conheço nenhum
caminho para chegar até ele –
Mão alguma ou palavra
são capazes de alcançá-lo.
Amigo, seja o que for
que dele retenhas,
Por conta própria,
Sem que o peças, sem
que o conheças, tem-no
Como uma dádiva.
Qualquer coisa que eu
possa te dar é de menor valor –
Seja uma flor, seja
uma canção.
Referência:
TAGORE, Rabindranath.
Gift. Translated from Bengali to English by William Radice. In: PINSKY, Robert;
DIETZ, Maggie (Eds.). American’s favorite poems: the favorite poem
project anthology. New York, NY: W. W. Norton, 2000. p. 265-266.
❁